A noite é a
maior ilusão de
todas.
e por isso mesmo
é que nós os
desiludidos a fruímos
sempre que podemos.
e o fruir é tanto maior quanto
maior é a supresa com que ela nos abraça
se roça, nebulosa
raposa
em nós.
Deitamo-nos com a boca seca
e damos graças à noite
damos graças
pela noite.
(talvez o nosso erro seja receá-la e
não a consumir mais vezes)
Da minha janela vejo o Bósforo todos os dias: divisões e correntes, agitações e marés. Tal como no homem, tal como no mundo.
sexta-feira, 30 de outubro de 2009
quarta-feira, 28 de outubro de 2009
domingo, 25 de outubro de 2009
tu disseste
Tu disseste: "Quero saborear o infinito"
Eu disse: "A frescura das maçãs matinais
revela-nos segredos insondáveis"
Tu disseste: "Sentir a aragem que balança os dependurados"
Eu disse: "É o medo que nos vem acariciar"
Tu disseste: "Eu também ja tive medo. muito medo;
recusava-me a abrir a janela, a transpor o limiar da porta"
Eu disse: "Acabamos a gostar do medo,
do arrepio que nos suspende a fala"
Tu disseste: "Um dia fiquei sem nada.
Um mundo inteiro por descobrir"
Eu disse: "O que é que isso interessa?"
Tu disseste: "Nada..."
Tu disseste: "Agora procuro o desígnio da vida;
às vezes penso encontrá-lo num bater de asas,
num murmúrio trazido pelo vento, no piscar de um néon;
escrevo páginas e páginas a tentar formaliza-lo.
Depois queimo tudo e prossigo a minha busca.
Eu disse: "Eu não faço nada.
Fico horas a olhar para uma mancha na parede"
Tu disseste: "E nunca sentiste a mancha a alastrar,
as suas formas num palpitar quase imperceptível?"
Eu disse: "Nao. A mancha continua no mesmo sítio,
eu continuo a olhar para ela e não se passa nada"
Tu disseste: "E no entanto a mancha alastra
e toma conta de ti, liberta-te do corpo. Tu é que nao vês"
Eu disse: "O que é que isso interessa?"
Tu disseste: "Nada..."
Mão Morta, "Tu disseste"
sexta-feira, 23 de outubro de 2009
aspas
se sempre fosse
sempre, seria
"sempe"
porque
só assim a
eternidade deslizaria
por entre
o líquido entardecer
das palavras de quem sente.
Mas como sempre sempre
tem um érre, há
sempre quem
ferre o que de
"sempe" sempre
tem.
sempre, seria
"sempe"
porque
só assim a
eternidade deslizaria
por entre
o líquido entardecer
das palavras de quem sente.
Mas como sempre sempre
tem um érre, há
sempre quem
ferre o que de
"sempe" sempre
tem.
segunda-feira, 19 de outubro de 2009
isto é muito bonito...
Uma das mais belas odes ao Hip-Hop (musical e filmicamente). Doce, doce, doce...
[Norah Jones:]
Life's filled with graaaay...
But now, it comes clean...
Leaves fall, awaaaaaay...
Hip-hop is playing again
And it's bangin, toooo...
Know it's bangin, for you...
Don't stop this feeling I feel...
I just wanna lay around all day
And feel the breeze upon my knees
I'm so INTO your rich history...
Tell me a story to taaaake me away...
Come and take meeeeee, ooooooh...
Come and take meeeeee with yooooou...
[Chorus x4: Norah Jones]
Life is, better
Now that, now that I found you
Life is, better
Now that, now that I found you
sábado, 17 de outubro de 2009
Deixei a carta selada depois
do inusitado
e apaziguador carteiro
me devolver a vida
que trazia na sacola.
disse-me que havia sido rejeitada
com a indicação de
"buraco desconhecido".
Pôs-me a mão no ombro e
quase me obrigou a lamber, ali mesmo,
o envelope com
o cuspo seco e aflito de
quem conserva cartas
sem ter lugar para as guardar. Não
ripostei e dei-lhe a carta para a sacola.
Nessa tarde, sei bem
que era de tarde,
enviei uma carta e
recebi outra. A primeira chegou,
continua ainda hoje a dizer-me o carteiro, ao seu destino;
a segunda, essa, a devolvida, continuo sem lugar
para a esconder.
mas o carteiro sempre diz:
"já não há nada para esconder!,
confie em mim!", brilhando-lhe
os olhos.
E eu, então, confio e
escrevo cartas e letras e palavras
e linhas
e isto.
Tudo isto
eu escrevi depois da tarde em que
o inusitado
e apaziguador carteiro cedo chegou,
desesperadamente cedo chegou.
do inusitado
e apaziguador carteiro
me devolver a vida
que trazia na sacola.
disse-me que havia sido rejeitada
com a indicação de
"buraco desconhecido".
Pôs-me a mão no ombro e
quase me obrigou a lamber, ali mesmo,
o envelope com
o cuspo seco e aflito de
quem conserva cartas
sem ter lugar para as guardar. Não
ripostei e dei-lhe a carta para a sacola.
Nessa tarde, sei bem
que era de tarde,
enviei uma carta e
recebi outra. A primeira chegou,
continua ainda hoje a dizer-me o carteiro, ao seu destino;
a segunda, essa, a devolvida, continuo sem lugar
para a esconder.
mas o carteiro sempre diz:
"já não há nada para esconder!,
confie em mim!", brilhando-lhe
os olhos.
E eu, então, confio e
escrevo cartas e letras e palavras
e linhas
e isto.
Tudo isto
eu escrevi depois da tarde em que
o inusitado
e apaziguador carteiro cedo chegou,
desesperadamente cedo chegou.
sexta-feira, 16 de outubro de 2009
a diferença que afinal é igual hoje e ontem
Ouvi pela primeira vez esta música cantada pelo Jamie Cullum. E lembro-me tão bem de quando foi...
Há dias, ouvi-a cantada por Dinah Washington, no filme Chungking Express.
Coisa bela, hein?:
"Twenty-four little hours
Brought the sun and the flowers
Where there used to be rain
My yesterday was blue, dear
Today I'm part of you, dear
My lonely nights are through, dear
Since you said you were mine
And the difference is you..."
Há dias, ouvi-a cantada por Dinah Washington, no filme Chungking Express.
Coisa bela, hein?:
"Twenty-four little hours
Brought the sun and the flowers
Where there used to be rain
My yesterday was blue, dear
Today I'm part of you, dear
My lonely nights are through, dear
Since you said you were mine
And the difference is you..."
quinta-feira, 15 de outubro de 2009
bota-coisa-nenhuma
Neste país, enquanto autocarros fazem greves e pessoas chegam tarde a casa e às sua famílias, enquanto casais de namorados discutem com olhos de amargura e indigentes passeiam a fome numa mão suja da moeda que nos sai do bolso (a uns mais, a outros menos), há quem se lembre de fazer uma festa de inauguração de um estabelecimento comercial que vende cafeteiras. Neste país, nos poucos autocarros que levam os cúmplices anónimos para os seus lares, os olhares retêm-se na bizarria de uma festa de inauguração onde não falta tapeçaria vermelha, garçons engravatados, focos de luz hollywodescos, muito design muito roxo e muito preto (que é "sóbrio", e muito), música de melodia nenhuma bem alta, mulheres vagamente sencientes de vestidos para ocasião e convidados com uma desgostosa "honra" inscrita algures entre a testa e e o chão que pisam.
Neste país, que uns apelidam de "novo-rico", que outros acusam de um viver "bacoco" e ainda onde muitos resmungam para o lado: "cambada de parolos", neste país, é neste país, que eu vivo. Não tenho outro. Nem quero ter. Gosto dele.
Mas quero escrevê-lo e ser livre para o chamar de novo-rico, bacoco e entrever a cambada de parolos que nele cava uma vala de idiossincrasias plásticas, que nos são estranhas, que não são nossas.
Este país deu-me a liberdade e eu faço por a merecer.
Neste país, que uns apelidam de "novo-rico", que outros acusam de um viver "bacoco" e ainda onde muitos resmungam para o lado: "cambada de parolos", neste país, é neste país, que eu vivo. Não tenho outro. Nem quero ter. Gosto dele.
Mas quero escrevê-lo e ser livre para o chamar de novo-rico, bacoco e entrever a cambada de parolos que nele cava uma vala de idiossincrasias plásticas, que nos são estranhas, que não são nossas.
Este país deu-me a liberdade e eu faço por a merecer.
quarta-feira, 7 de outubro de 2009
=
Também nós os dois vivemos à noite, como nos filmes...
Sofremos e sorrimos, de passagem. Sempre de passagem. Tudo é de passagem, aliás... Como eles, como nos filmes.
Deixemo-nos cair no verde, ao menos. Essa sorte ainda eles a tiveram... os dos filmes.
Sofremos e sorrimos, de passagem. Sempre de passagem. Tudo é de passagem, aliás... Como eles, como nos filmes.
Deixemo-nos cair no verde, ao menos. Essa sorte ainda eles a tiveram... os dos filmes.