sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

É engraçado como certas situações, quando nelas estamos envolvidos, podem parecer a certa altura quase insuportáveis, próximas de um fim irresistível. Inexorável.
Pensava eu numas pequenas festas, chamemos-lhe assim, que um amigo meu costumava dar em sua casa. Ora ele vivia num andar de um prédio com uns bons outros 15 andares. Direito, esquerdo e centro.
Por baixo de sua casa vivia uma família. O pai era um tipo mal encarado. Pelo menos assim me parecia de cada vez que tocava à campanhia e ameaçava, não só desancar-nos à pancada, como partir a meio a casa do meu amigo.
Isto aconteceu repetidas vezes. Também chegou a chamar a polícia, que, diga-se de passagem, parecia bem menos ameaçadora ao lado de toda aquela fúria colada a uma cabeça careca.
De cada vez que isto acontecia, e deixe-se para outra oportunidade a má educação e a falta de civismo minha e dos meus amigos, eu pensava para comigo até que ponto é que isto ia durar. Até que momento o vizinho não perdia a cabeça e fazia uma maluqueira qualquer. Ou, então, até que momento iríamos nós parar de fazer barulho. Isto parecia-me mais distante. Mas o que me fazia pensar era o facto de aquela situação ser de tal forma insustentável que não imaginava o correr da vida sem que algo mudasse. Havia uma necessidade imperiosa de acontecer algo. Boa ou má, não sei. Mas alguma coisa, que mudasse o estado (frágil) das coisas.
Eu pensava muito nisto com uma certa consciência culposa de adolescente confuso.

Hoje lembrei-me de tudo isto. Deixei de frequentar essa casa e essas festas há já algum tempo. Não sei se elas ainda são feitas, e se o barulho continua a atingir decibéis de insolência. Mas quando vejo o meu amigo, o dono da casa, vejo que a vida dele continuou a correr. E não me parece ter havido nenhum facto decisivo relativo àquele problema. Provavelmente a família vizinha do piso abaixo continuará a ouvir de vez em quando a aparelhagem de cima a arranhar.
Por mais insuportável a que uma situação ameaçe chegar, parece que as pessoas vão sempre amparando mais ou menos as coisas, remendando aqui e ali. E tudo vai correndo, sem grandes problemas. As chatices vão-se diluindo, não por remédios eficazes, mas pela passagem do tempo. Há outras coisas para fazer, também. Um dia corre melhor e nessa noite se calhar a música até faz sorrir alguém, recordando-lhe outros tempos. O insuportável, afinal, não era assim tão insuportável. A vida, essa, segue.

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