segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

quando ser diferente é ser igual

No Público da passada sexta-feira, dia 20 Fevereiro, nas últimas páginas inseridas no espaço de opinião, António Vilarigues assina uma coluna com o título "O meu Marx é diferente".
No primeiro parágrafo temos isto:
A propósito da actual crise económica e financeira do sistema capitalista, a obra de Karl Marx ganhou um novo relevo. Mas muito do que se escreve e diz revela um desconhecimento (ou ignorância) atroz. Falam de Marx, mas aparentemente nunca o leram. Quanto mais estudarem-no. O resultado é uma deturpação objectiva do seu pensamento. Uma caricatura ridícula da realidade da sua acção.

Ora eu não podia estar mais de acordo com estas palavras de Vilarigues. Fiquei logo entusiasmado.
O pior vem depois.

É que depois deste aviso à navegação, fiquei eu numa grandíssima expectativa sobre o Marx de Vilarigues. Aguardando então por uma abordagem profunda, sapiente e quiçá singular (talvez já estivesse a exigir demais) do pensamento marxista. O primeiro parágrafo justificava toda esta água na boca.
Mas foi sol de pouca dura. Até ao fim do texto, Vilarigues fala de todos os lugares-comuns do marxismo, de todas as tiradas célebres já batidas e rebatidas, de todas as leis (supostamente) ciêntíficas já vistas e revistas. Não diz nada de novo, não cria nada original. Acaba por, paradoxalmente, vulgarizar o Marx que tanto queria re-originalizar.
No último parágrafo, diz ainda Vilarigues, num último suspiro, que espera "ter demonstrado que o meu Karl Marx (e Friedrich Engels) é efectivamente diferente das vulgatas que por aí se vão vendendo". E ele, qual dinâmico burguês mercantilista, que não fez outra coisa senão vender-nos vulgatas...
Repare-se até na vulgaridade e no reducionismo que é falar de Marx apenas tendo em conta Engels. Chega a parecer um sofrido trabalho de grupo do secundário...
É caso para dizer que o feitiço se vira contra o feitiçeiro quando alguém vulgariza e nada de traz de novo ao pensamento de que ele próprio se diz ser um conhecedor de fundo, alheio às superficialidades dos outros que o citam.
O Marx de Vilarigues não é diferente. É que neste momento eu acho que nem sequer ortodoxo é. É sim tão comum como o de qualquer um que nunca sobre ele reflectiu, estudou. Descomprometidamente, claro.
É que no caso de um marxista ortodoxo sabedor, por mais sectária que fosse a sua posição, poderíamos ficar a saber novas coisas de que nunca tinhamos ouvido falar, novas abordagens ou interpretações inovadoras.
Vilarigues não traz nada disto, acabando por perder uma oportunidade de ficar calado em vez de contribuir para o punhado hermético de lugares-comuns que hoje existe quando se fala em Marx. É pena.

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