segunda-feira, 23 de março de 2009

Popper diz que para uma sociedade democrática em constante e incessante aperfeiçoamento é fundamental uma "discussão critíca e racional" (são palavras dele) permanente. Pois é desta discussão, do debate, do conflito de ideias que se aprofunda a democracia e suas instituições. Aqui até é engraçada a visível reminiscência da dialéctica hegeliana como motor filosófico do desenvolvimento (latíssimo sensu).
Mas voltemos a Popper. Acrescenta ele então que, tendo nós em conta a importância desta discussão como caminho para uma "sociedade mais sensata" (novamente palavras do próprio), percebemos então como a Utopia (como fim, suponho eu), enquanto estádio alcançado e, a partir daí, estático, não promove esta discussão, este conflito de ideias. Não avança, não desenvolve. Não se supera.
Eu concordo com isto.
Mas se não alumiarmos o caminho com Utopias, não caíremos também em situacionismos estáticos onde a discussão - sempre ela - fica também amorfa, desprezada, esquecida?Não são afinal as Utopias grandes fomentadoras da discussão e do confronto (que se querem racionais e críticos)?
A esta questão acho que se responde com o argumento utilizado por um meu amigo com quem partilhei estas dúvidas: utopia (qualquer que ela seja no sentido do progresso do Homem) sim, sempre. Mas como caminho e isntrumentos de discussão e nunca como fim. Porque enquanto fim é estática e eliminadora da supracitada discussão. E, por isso, do progresso do Homem.
Eu também concordo com isto.

3 comentários:

  1. popper critica o pensamento de hegel e vários pontos, principalmente no que toca ao historicismo, a análise historicista. marx teria acertado em quase todas as suas análises às instituiç~es, mas nenhuma das suas profecias historicistas seriam correctas (popper dixit, eu concordo).

    passo-te agora um excerto da análise da mecânica utópica do pensamento de popper, talvez te ajude a desrelativizar o conceito popperiano de utopia:

    "A mecânica utópica depende da crença platónica num ideal absoluto e imutável, da crença que há métodos racionais para det. qual é esse Ideal e quais os métodos para a sua realização. o esteticismo e o radicalismo da mecânica utópica conduzem ao irracionalismo: substituem a razão por uma esperança desesperada em milagres políticos, ao rejeitar a tentativa e erro da mecânica gradual."

    penso que está aqui o cerne da questão. o mundo melhor não é uma utopia, a utopia resulta destes mesmos mecanismos utópicos.
    como os mecanismos utópicos são tal e qual como descritos atrás podemos resumir que, para Popper, não existe realmente Utopia, mas uma Distopia.

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  2. Mas o que eu refiro em relação à dialéctica de Hegel nada tem a ver com o historicismo hegeliano. Nada. Naquilo que eu toco, que é na discussão como meio de avanço e desnvolvimento, é que é possível traçar um certo paralelo com a ideia da dialéctica de Hegel. O que é, ao fim ao cabo, a dialéctica de Hegel que não uma discussão?

    Quanto às Utopias, tudo se resume, creio eu, à ideia que referi já anteriormente: utopia como caminho e utopia como fim.
    E negar que o homem, desde sempre, viveu de utopias como caminhos, é não o compreender.

    Impressionante essa tirada da "Distopia". Já agora, o que é?

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  3. sei que até achaste piada a esta tirada da Distopia. Eu desconhecia o conceito até ler o prefácio da obra de Aldus Huxley, Admirável Mundo Novo, e não sei se o mesmo era feito por ele ou não. tenho de pegar de novo na obra e agora não está a dar muito jeito.

    a distopia parte, propositadamente, do grego. enquanto que utopia tem o significado da sociedade imaginária, ideal, inexistente e perfeita (dis-topia, do grego, Não-Existente) a distopia é o oposto da utopia, é a utopia negativa.
    A Utopia, para os Utópicos, é (quase, em muitos infelizes casos) boa demais para ser praticada.

    A análise da Utopia Marxista por Popper, ou da Utopia Totalitarista, ou mesmo Autoritarista, traz as suas enormes deficiências e a sua confiança na "engenharia social".
    No seu esforço uniformizador, acontecem mutações sociais que custam vidas.
    Por isso eu digo que para Popper, certas ideias, como a de Marx, não são Utópicas (ou seja, boas demais para ser praticáveis), são antes distópicas (más demais para ser praticáveis).

    O Admirável Mundo Novo é um Livro Distópico. o 1984, como podes depreender pelo raciocínio, também.

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