Admiro aqueles que, escrevendo com mais ou menos qualidade, se conseguem abrir no seu blog. Que soltam os seus medos, que descrevem as suas frustrações, que deixam transparecer o mais fundo de suas almas.
Eu não consigo. E, na maioria das vezes, também não quero. Sentir-me-ia nu. Desprotegido, frágil. E isto independentemente de ser lido por muita ou pouca gente, coisa de que, na verdade, sou totalmente desconhecedor.
Todavia, quanto mais aprisiono os meus fantasmas, mais sinto que me isolo na negritude. Mais fundo desço no poço.
E parece que quanto mais leio os ditos blogs, mais aversão sinto à possibilidade de me expôr. Parece que já foi tudo dito. Que já tudo foi sentido e sofrido. E não é verdade! O que sinto é singular. Como o de qualquer um, suponho.
Mas, afinal de contas, que estou eu a fazer agora senão aquilo que disse até aqui não conseguir fazer? Só tomei outro caminho...
o bom de escrever é chegar ao fim e saber que cada um leu a sua própria história sem ser a história de ninguem. e é por isso que nao te despes porque o que tu escreves é sempre singular, numa palavra só tua,num texto de todos e de ninguem!
ResponderEliminar"E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm."
Noronha,
ResponderEliminarAcho que tens vindo a abrir-te mais, e os dois últimos posts mostram isso mesmo. E não digo isto em tom de elogio mas de constatação. Mas uma constatação talvez com um certo contentamento, não por mim, mas por ti.
Isto porque acho que essa abertura corresponde a um fenómeno mais profundo de transformação na tua personalidade que te está a tornar alguém mais de mais fácil comunicação, alguém mais agradável. As pessoas tendem a dar-se mais a quem se dá mais também (na verdade acho que se sentem obrigadas a isso) os laços assim criados não são mais verdadeiros ou mais falsos por serem mais fáceis de criar.
E agora mais outra confissão (deve ser por estarmos na Páscoa que estou assim) eu passei a gostar mais da Clara por causa do blog dela e de comentários como este último.
Ora aí está, tinha de ser o meu manito a dizer tudo. Não o poderias ter dito de melhor forma. Concordo plenamente contigo,ainda que eu próprio tenha vindo a mudar sobre isso e tu também pelos vistos,acho que ninguém se deve expôr tanto nem a si nem a ninguém individualmente, num blog,afinal é a nossa vida, e se quisermos desabafar que escrevamos um diário pessoal. Um diário pessoal sim, e não um diário pessoal de consulta pública.
ResponderEliminarUm grande abraço
Obrigado pelos comentários, caros amigos. Infelizmente, acho que ninguém percebeu muito bem o que quis dizer. Deixei de gostar de fazer comentários dirigidos a cada um dos "comentadores", mas agora vou fazê-lo novamente, porque não vejo melhor forma de dar resposta.
ResponderEliminarClara,
A questão é que eu não escrevo. Há tantas e tantas coisas por que passo no meu dia que penso em (d)escrever mas que, poucos minutos depois, ponho completamente de lado. Anoto noutras folhas que não estas...
Ary,
Compreendo o que queres dizer. E concordo em parte. Mas... tu também conheces as pessoas quanto mais próximo delas estás. Talvez agora também estejamos mais próximo um do outro. Isto para dizer, e sintetizando, que quem me conhece melhor, sempre reconheceu em mim uma qualidade (ao menos esta!): a comunicação fácil, o "ser acessível". Acho que não estou a ser presunçoso. Talvez agora, dada a proximidade, te apercebas mais disso. De todo em todo, sim, tens razão em alguma coisa que dizes. Mas prefiro deixar para um conversa a dois. Gostava muito, aliás.
Tiago,
Também compreendi o que escreveste. Mas eu não vejo mal em alguém se abrir nas palavras que escreve. Por públicas que elas sejam. O ponto é mesmo esse: às vezes eu gostava de me conseguir "publicizar" mais...
De qualquer forma, agradeço-vos os comentários que deixaram. Aprendo sempre mais um bocadinho de mim com vocês. E isso tem para mim uma importância muito maior do que vocês imaginam!
Um abraço.
Percebo o que dizes e descodificando o que disse em cima, não deixa de ser menos teu o que escreves só porque já viste essa dor, essa emoção noutro lado, como não é necessariamente a tua vida que está nas linhas (talvez nas entrelinhas, mas não nas linhas) do que aqui pautas.
ResponderEliminarNão sei se me consegui fazer entender muito bem até porque escrever por si só já é algo tão pessoal (que atire a primera pedra quem nunca se escreveu!) que ao mesmo tempo acaba por ser impossível alguem adivinhar ou ver-te por inteiro naquilo que dizes, e por outro lado dá sempre uma margem de liberdade para nos revermos nas histórias dos outros, ou simplesmente histórias contadas pelos outros.
O que escreves é aquilo que "tu" queres que seja e nunca o que os outros acham que é, não quando se trata de ti, e só chega a ser o que "eles" querem quando pelas tuas palavras lêem as suas histórias tambem!
E quando pensares que estás nu perante o que dizes, lembra-te que sabes mais do que ninguem o que te levou a dizê-lo, eles nunca saberão :)
Aproveitando aqui a ponte de ligação, Ary, obrigada :)
Beijinho
Aproveitando aquilo que diz o Ary sobre a Clara, eu gosto mais de ti desde que leio o teu blog, mesmo que aches que não te abres nele por aí além. A mim parece-me que o fazes, mas à tua maneira (muito própria, aliás). E eu gosto dessa maneira, confesso. Gosto muito mais dela do que da minha, por exemplo. Não sei bem explicar porquê, mas vejo este blog como um blog 'equilibrado'. Dizes muita coisa e muito de ti, mas quase sempre de uma forma camuflada e, tantas vezes, enigmática. A mim parece-me bem... Acho que já to tinha dito, mas não faz mal repetir. Um beijinho
ResponderEliminarEssa nudez também já me assustou um dia.. E é a razão pela qual nunca escrevi um diário... ou já quis acabar com o meu blog.. é dificil de explicar mas neste texto está implicito exactamente os meus motivos para o fazer.. Parecer-me-ia que "eu reflectida no papel me tornava nada e já não tinha importância" mas "eu fechada sobre mim mesma parecia infiltrar-me num emaranhado escuro de onde brevemente não iria conseguir sair"..
ResponderEliminarA verdade é que não te conheço, a verdade é que estou a comentar de forma banal e até atrevida, mas a verdade é que quando li este texto senti pela primeira vez que alguém exprimiu exactamente algo que eu ja senti e tentei explicar e nunca consegui...
Do que li só retiro o que vi de mim aí reflectido, de ti ou do que ai quiseste pôr não posso dizer nada..
Mas a mim a pior coisa que me podiam fazer era escrever o meu diário descrevendo tal e qual todos os passos e sentidos da minha vida, depois de publicado, ia-me sentir a pessoa mais suja, mais nua, mais idiota do mundo, porque a minha história deixaria de ser minha, deixaria de ser especial e vendo-me reflectida no papel eu iria dar-me mt menos importância aquilo que sou e ao que vivi... é dificil de explicar... Mas foi por isso que a unica vez que tentei escrever uma amostra de diario, queimei-o, senti-me mt mal mesmo...
Prefiro a inteligência enigmática e os duplos sentidos, sem sermos falsos somos sinceros e deixámos os outros encontrarem-se em nós sem nunca nos descobrirem ou apropriarem-se do que é nosso, da nossa essencia...
Acabei o comentario e sinto-me insatisfeita não consegui de todo transmitir aquilo que senti ao ler o texto e como me sinto quando me refugio do mundo do mundo me conheceu demais...
mas para acabar e como já vai muito longo quero partilhar só isto
"quando escrevi aquela amostra de diário, eu ver ali a minha história, o que eu acho que me fez mais confusão é que no papel tudo parece banal e nada complicado enquanto na minha cabeça a minha vida parecia muito mais complexa, por isso prefiro deixar a história na minha cabeça, e no papel só rasgos dela enigmaticos... porque eu quero ser especial nem seja só para mim própria.."
Devemos ter a capacidade de encontrar o equilibrio: não nos mostrarmos demais nem nos fecharmos sobre nós próprios porque nem um caminho nem o outro nos deixam ser felizes poruqe em jogo nada mais está que a nossa identidade, o mais precioso que temos...
Obrigada e desculpa a invasão e o prolongamento nas palavras
Desculpa se me alonguei e se parti deste texto e usei este blog para mostrar algo de mim, que me parece estranho mas obrigado, neste texto encontrei algo que me fex rever uma coisa que eu pensava que ninguém compreendia...
Queria visitante,
ResponderEliminarDeixaste estes dois excertos entre aspas, pelo que presumo não serem teus. Vou dobrar as aspas, por neles me sentir reflectido. Mas tal e qual. É assustador. Por vezes, nem para mim escrevo, mesmo que noutros lugares que não num blog, justamente por achar que no papel, a complexidade e a profundidade do que sinto se banaliza e deixa fugir a genuinidade de quando o pensei. Ser especial, nem que seja para nós mesmos... é mesmo isso. Até o papel onde poderíamos escrever nos pode parecer um inimigo. Porque descaracterizador dos nossos mais fundos pensamentos. Creio chegarmos aqui a um outro ponto, este do ponto de vista intelectual (e altamente subjectivo): será o bom escritor aquele que consegue fazer essa transmissao cabeça-papel e, uma vez vez escrito o pretendido, não sentir a tal banalização?
Mas a resposta tem de ser não. Porque o bom escritor é muito, muito mais que isso. Mas bem, isto dava para fazer um ensaio, que já se afastaria, no entanto, disto que temos vindo a falar. Ensaio para o qual não tenho capacidade, nem tempo. :)
Um abraço e obrigado pela visita. Pelos vistos, não estamos assim tão sós. Em pensamentos e no mundo dos blogs.
"eu reflectida no papel me tornava nada e já não tinha importância" mas "eu fechada sobre mim mesma parecia infiltrar-me num emaranhado escuro de onde brevemente não iria conseguir sair"
"quando escrevi aquela amostra de diário, eu ver ali a minha história, o que eu acho que me fez mais confusão é que no papel tudo parece banal e nada complicado enquanto na minha cabeça a minha vida parecia muito mais complexa, por isso prefiro deixar a história na minha cabeça, e no papel só rasgos dela enigmaticos... porque eu quero ser especial nem seja só para mim própria.."
Chico,mas a verdade,pelo menos para mim,é que no momento queremos dizer tudo,mas quando se trata de escrever no blog,doseamos as palavras,e como tu disseste,o que se quer verdadeiramente descrever ficam noutra folhas de lado. Eu pelo menos tento expor o menos possível,sendo que há vezes que a vontade é tanta de escrever tudo,que não há como escapar. Penso que o equilibrio é o ideal,nao demasiado público,não demasiado privado. É isso que admiro em alguém que escreve,saber camuflar o que sente,mostrando-o cuidadosamente aos outros através da sua escrita. E até agora tu tens feito bem isso.
ResponderEliminarRevejo-me aqui não em palavras mas por falta delas...vejo sim, que cada letra, cada palavra, cada frase é sentida por ti! Enquanto cada rabisco, cada traço, cada recta e plano vão ao encontro do ponto certo para mim, os meus pequenos desenhos...
ResponderEliminarenquanto desenho mostro como sou mas compreendo o quanto difícil é expor assim todos os meus medos e fantasmas, mas algumas vezes apenas delineio aquilo que seria uma perfeito desenho para alguns e um grande medo para mim, um abstracto puro que esconde o que vai na alma! afinal todos temos medos uns mais do que outros há que saber é conseguir ultrapassa-los com arte!!
Um abraço para ti também :)
ResponderEliminarO que está entre aspas é mesmo da minha autoria, só está entre aspas porque são pensamentos meus que eu queria realçar, foi só uma forma de recorrer à pontuação para te chamar a atenção para eles e para ver se nos tínhamos percebido no que ambos escrevemos.. e parece que sim...Não estamos sós.. e tudo que acabaste de escrever, Bem, não tenho muito a acrescentar, só digo "é exactamente isso"...
Acho que concordámos... Eu às vezes chego ao cúmulo de escrever textos no blog e depois retirá-los imediatamente :(
Bem quanto à questão do que é ser um bom escritor??
isso é uma boa questão...
Eu adoro escrever, sinto-me livre, sinto-me "Eu", imagina-te naquilo que mais gostas e sentirás como me sinto quando escrevo.. Já fiz dois livros para mim própria de poesia (antigamente detestava poesia)..
E essa questão "O que é um bom escritor?", deixou-me a pensar e se te fosse a responder também nunca mais saíamos daqui, talvez um dia escreva algo sobre isso...
Mas talvez parte da resposta esteja no modo como acabaste o teu texto
"Mas, afinal de contas, que estou eu a fazer agora senão aquilo que disse até aqui não conseguir fazer? Só tomei outo caminho... ", depende do caminho que escolhes para te exprimires, podes perfeitamente escrever, exprimir o teu estado de alma de uma forma tão camuflada que a tua essência e genuidade fique protegida e intacta.Isto porque tornas-te o texto tão especial e tão complexo como tu, porque só tu o vais compreender, e por mais que te digam que adoram o texto, tu sabes que só tu o compreendeste e talvez seja essa parte da solução...
Depende do modo como tu és, da tua natureza, se escreveres, e se leres de seguida o que escreveste, se isso não te fizer sentir mal, talvez tenhas alcançado o que é ser um bom escritor. O engenhoso arquitecto que constroi um texto, mexendo com as palavras e os sentidos, transparecendo aquilo que sente de modo a que quem leia só o perceba, se já o sentiu ou tire daí um significado diferente... E nunca te sentirás desprotegido porque sentirás que o que escreveste é somente teu e só tu e mais ninguém o compreende verdadeiramente e porque foste subtil o suficiente para que não te banalizasses, nem desses de mão-beijada e de forma fácil o teu ser, e não te sentes explorado mas antes o gosto que as pessoas te exploram mas tu estás protegido... entendes???
e talvez depois sintas um gosto particular quando alguém escreveu algo tão perfeitamente que se encontrou contigo no teu interior. ( como aconteceu quando li o teu texto).
E a resposta continua no equilíbrio, "Escrever, sim, mas para que eu me sinta bem e me liberte dos fantasmas sem caminhar para esse poço, só como forma de me libertar, mas tu tal como eu, não gostamos de nos expor ao ponto de nos sentirmos vazios e ridiculos com os nossos proprios pensamentos" e com isto espero nao ter dado um tiro no escuro:)
O que está aqui entre aspas é da minha autoria:)
foi com muito gosto que visitei este blog e pude dialogar com o autor e partilhar umas quantas palavras de encontro intelectual.
talvez o que escreveste neste texto também seja a resposta para eu ainda ter partilhado com amigos mt mt chegados os meus livros, porque mt de mim está lá, e eu sou Especial, e não quero que o que está escrito me deixe nua, quer eu quer o que está escrito tem de parmanecer especial... e se eu escrever e me sentir mal com o que escrevi, me revir ali e me sentir suja, rasgo na hora e acabou-se o tormento, há coisas que devem ficar só no nosso pensamento e nao devem sair cá para fora :)
Noronha, acho que este excerto do Torga reflecte a forma como o que pensamos mal se reflecte no papel:
ResponderEliminar"A percorrer de novo as estradas de França, esse sentimento doloroso da ambiguidade do literário, da artificialidade inevitável que havia em cada página, agravou-se mais ainda. Já sem falar nas mil prudências e cautelas da voz interior que as ditava - mau grado o consciente esforço de escancaramento das portas da intimidade -, as frases que ia lançando ao papel tornavam-se postiças e convencionais só pelo facto de serem formuladas. O ângulo escolhido para as começar, o arranjo gramatical que vinha a seguir, a selecção e monda dos vocábulos roubavam-lhes toda a verdade. O que fora dentro de mim tumulto e turbação, adquiria nelas compostura e claridade. E a alma sentia-se ali caricaturada. Ah, a linguagem absoluta do silêncio! Mas começava aí, precisamente, a crucificação do escritor. A paz da mudez era-lhe vedada. Galeriano do verbo, servidor da expressão, tinha de sofrer nela o martírio da sua própria incomunicabilidade."
abraço
Tiago,
ResponderEliminarTal e qual... Perdoa-me a ingenuinidade, mas não sabia que escritores como o Torga também o sentiam. Pensava que era tudo bem mais fácil...
E tu? Também sentes isto? A resposta a esta pergunta torna-se para mim particularmente interessante dado o gosto e a admiração pelo que tu escreves.