terça-feira, 9 de junho de 2015

um balão cheio de maturidade lá dentro

Na televisão, numa reportagem por algumas escolas, uma miúda (16, 17 anos, talvez), com ar duro mas esperto, diz, num misto de militantismo e espontaneidade: “o amor não é tudo na vida”. Ouvimos isto e pensamos: aqui está uma miúda madura. Porquê? Provavelmente, pelo facto de, há mais ou menos algum tempo atrás, determinada(s) experiência(s) nos ter(em) levado a acreditar, hoje, nessa ideia, assim como por temos esse ensinamento bem vivo no presente, i.e., no exacto momento em que a frase daquela miúda nos entra pelos ouvidos com uma instantaneidade de verdade esmagadora. Acontece que isso não quer necessariamente dizer que aquela miúda é madura ou que aquela frase é reveladora de maturidade. Nem que a frase continue a fazer sentido para nós daqui a cinco anos. E se, passado esse tempo, já não fizer sentido, em que tosco lugar fica a maturidade? Deixou a frase de revelar maturidade? Nós deixamos de ser maduros por já não nos revermos nela (contrariando a escala "cronológica" do amadurecimento)? A miúda deixou de ser madura?

A ideia de maturidade, ou daquilo que é sinal de maturidade, é das coisas mais débeis com que vivemos (com excepção no que toca ao vinho e às obrigações jurídicas), e o mais surpreendente é que, não obstante, é das ideias feitas mais consolidadas no senso comum e que, por isso, mais intensamente circulam no discurso sobre a nossa existência, sobre assuntos morais, até na política. Ela tem latente um processo de cristalização da experiência, de consagração de "dados adquiridos"; tem latente uma de certo modo ingénua (o perfeito oposto de... maturidade) percepção de uma meta alcançada, algo que, aparentemente, não sofre mais variações e que, na sua constância (ou pela sua constância), fixa um parâmetro de comportamento e de aferição dos restantes à sua luz. Todavia, se, daqui a uns anos, já não nos identificarmos com aquela frase - porque, por uma razão ou por outra, as circunstâncias da vida nos fazem crer, num dado momento, que, de facto, o amor é tudo na vida -, a ideia de maturidade esvazia-se tão rápida e embaraçosamente como um balão mal atado por uma criança.

Não sei que conclusão tirar disto; talvez a mais imediata seja a de lamentar a maturidade da miúda que (já) não acredita que o amor é (ou pode ser - ups, um pingo de maturidade misturado com "sensatez" a intrometer-se) tudo na vida. O que, por sua vez, me atribui a minha própria quota de maturidade, pois claro. Será que a nossa maturidade nos pode levar a dizer que uma miúda que, com esta idade, pronuncia uma frase deste teor é... imatura (mas porquê, porque é próprio das pessoas imaturas serem precocemente maduras?)? 

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