quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Walsh #33 Ponha os olhos nesta sopa de planos/Strangers on a Train (Sopa de Planos)



Saborosíssima, esta nova Sopa de Planos. Sobre óculos. Para ler no local do costume (clicar).

São marcas como estas que fazem os filmes de género constituírem-se nisso mesmo – em géneros. No caso, referimo-nos à circunstância de determinados objetos, aparentemente insignificante ou inofensivos, poderem ser essenciais, reveladores, determinantes para o desenrolar da narrativa nos thrillers, nos filmes de suspense, enfim, nos filmes de terror, nessa (aparente) insignificância acabando por reverberar, afinal, o registo MacGuffin hitchockiano que já tivemos, aliás, oportunidade de abordar numa outra Sopa de Planos. Em Strangers on a Train (Desconhecido do Norte-Expresso, 1951), o objecto principal que ilustra esse “tique de género” é o isqueiro que permitirá a resolução da trama. Mas há outros – e os óculos deste plano são, justamente, um desses exemplos, na medida em que funcionam como elemento confirmador daquilo que as aparências indiciavam, ou seja, o perfil psicopata de Bruno. Depois da voltinha de barco pelo “Tunnel of love” (com outro espantoso plano das figuras literalmente cavernais do casalinho e de Bruno e o seu chapéu no seu encalço) e do primeiro grito-comic relief da rapariga, Bruno, já em terra (desta feita na… “Magic Isle”), encontra-a e puxa do tal isqueiro, não para lhe acender um cigarro, mas apenas para identificar o alvo. “Is your name Miriam?” – “Oh yes…”, estas as últimas sorridentes palavras de Miriam (a primeira parcela da equação do perfect murder acertado no comboio), cujo lento estrangulamento nos é dado a ver pelos seus óculos “fundo de garrafa”, espécie de “janela indiscreta” avant la lettre (óculos que Bruno fará questão de “devolver” a Guy). E a culpa por esse voyeurismo é atirada para cima de nós, perdão, Miriam é “atirada” para cima de nós. Toda esta deliciosa sequência é conferível aqui.

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