quarta-feira, 1 de junho de 2016

força e (des)amor

"Faz mais ou menos o seguinte raciocínio: Não há mérito nenhum em portarmo-nos bem com os nossos semelhantes. Tereza é forçada a ser correcta com os outros habitantes da aldeia, porque senão deixaria de poder lá viver; e, até com o próprio Tomas, é obrigada a portar-se como uma esposa desvelada porque ela precisa dele. Será sempre impossível determinar com um mínimo de segurança em que medida é que as nossas relações com outrem resultam dos nossos sentimentos, do nosso amor, do nosso desamor, da nossa benevolência ou do nosso ódio, e em que medida é que estão previamente condicionadas pelas relações de força existentes entre os indivíduos.
A verdadeira bondade do homem só pode manifestar-se em toda a sua pureza e em toda a sua liberdade com aqueles que não representam força nenhuma. O verdadeiro teste moral da humanidade (o teste mais radical, aquele que por se situar a um nível tão profundo nos escapa ao olhar) são as suas relações com quem se encontra à sua mercê: isto é, com os animais. E foi aí que se deu o maior fracasso do homem, o desaire fundamental que está na origem de todos os outros".

Milan Kundera, A Insustentável Leveza do Ser.

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