quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

Playlist Janeiro - Rimas e Batidas





Muito para ler e ouvir na Playlist de Janeiro (aqui) do Rimas e Batidas.

Atirei-me à “Everything Is Yours”, uma faixa muito recomendável (que podem ouvir ali em baixo) do álbum pouco recomendável no conjunto da Kehlani – “SweetSexySavage”.
 
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«SweetSexySavage, acabadinho de sair, não é um grande álbum, nem Kehlani tem uma grande voz (e, nos melhores momentos, soa quase sempre a uma versão inferior à de Jhené Aiko, sobretudo em Twenty88, o seu último e excelente álbum colaborativo com Big Sean). Apesar do destaque que tem merecido por parte da imprensa, Kehlani parece ser mais um daqueles casos em que, só pela circunstância de o r&b e o trap estarem hoje na ribalta, qualquer artista que apareça a fazer música nesse registo é de imediato rodeado da maior atenção. Todavia, a californiana consegue, aqui e ali, ir sacando alguns momentos realmente bons, para o que muito contribui a overproduction – aqui até não num sentido negativo, mas no de produções opulentas e bem orquestradas – que a suporta. SweetSexySavage tem muito do r&b contemporâneo mais descartável que se faz actualmente (excepção de primeira água: Alexandria e o seu Rebirth, 2014), e, insisto, noutros tempos (que não nos de endeusamento do R&B em que hoje vivemos), seria rapidamente posta de lado.Ainda assim, a sequência composta por “Personal”, “Not Used To It” e “Everything Is Yours” é um pequeno oásis no meio de tanta chiclet, assegurando 12 minutos realmente prazerosos (vá, “Keep On” também merece louvores).
 
“Everything Is Yours”, em particular, é, talvez, a melhor dessas três canções, um lamento resignado sobre o primeiro amor, esse que doesn’t live here anymore (e que, pormaior decisivo, não é necessariamente o amor ingénuo de juventude, pois pode surgir aos 15 como aos 30). É nessa dualidade, nesse (frágil) balanço entre a saudade por esse amor (“Thinking ’bout things that I shouldn’t be (…) / Missing all that when I shouldn’t be”…) e a aceitação pacífica do seu irremediável fim, visto já à distância, já como “memória”, que reside a força da canção e a sua dimensão semi-trágica – semi porque não há aqui tristeza profunda, nem, porém, optimismo em excesso, apenas conformação. Enfim, apenas a melancolia de lermos, retrospectivamente, uma felicidade extrema nesses momentos idos (que já são “acontecimentos”, “factos” que, numa conversa com alguém, incluiremos nas “relações” que tivemos…) em simultâneo com o reconhecimento de os sabermos já – para o bem e para o mal – definitivamente encerrados. A isto se chama, dizem, “crescer”, “maturidade”, palavras, contudo, que bem poderão, mais tarde, vir a fazer ricochete em nós mesmos: voltaremos algum dia a conseguir dizer a alguém, com o mesmo arrebatamento, com a mesma abnegação… “Everything is Yours”?»

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