segunda-feira, 4 de junho de 2018

celebrámos a palavra na
cama
como todas as coisas devem ser celebradas
(quase todas)
a luz a entrar demasiado cedo no teu quarto
intrusões que não compões

armados de uma filosofia imbatível, apuradíssima, coada pelos muitos e derrotados dias, celebrámos

Não
(no princípio não era o Verbo, foi
a quietude do substantivo
olhos que dispensam mãos e coxas se tudo
o que queremos
é fixidez
o contrário da
acção, berlindes
que se devoram, imobilizados)

deixámos para amanhã o que podíamos fazer hoje, contrariámos o
universal e absoluto princípio
da eficiência. fora com esses
tecnocratas!

fizemo-nos revolucionários da espera
inaugurámos o comité da paciência
vírgula da
demora
e do
tactear

Pê Dê Tê! Pê Dê Tê! Pê Dê Tê!

prometemos corpos que cantarão amanhãs
mas só cantarão amanhãs
amanhã
hoje,
não
hoje,
Não é
a palavra
amanhã será com certeza
outra

promessas nada vãs para quem
nos quisesse ouvir ou
ver
como esse teimoso e furtivo sol
partículas alienígenas que te doiram a franja

migalhas que não limpo
copo de água que tombo
pelas tuas costas
a enxurrada cobre-me dos pés à cabeça
tu não vês
(o frio não se vê)

e novamente
Não
vai tu primeiro, eu
vou a seguir
separaste assim as águas
sim, Não! claro, Não, Não
e Não

monossílabos crescem orgulhosamente em nós, rebentam em
afirmativas esplendorosas que nos elevam
do chão
literalmente, digo
a já não sei quantos mil pés de altitude de ti
vou ao Nimas fazer tempo
ignorando que me falarás da Marine
(os fantasmas conhecem-se, já devia saber)

seres
teres sido

projecção
?

se as sombras do teu quarto não desapareceram
quando a luz
entrou

projector estragado.
bobinas que se emaranham no peito.
larguem-me, deixem-me as veias em paz
sangue quer correr livremente
na cabeça o
botão
ligar
desligar

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