"Aqui, no Norte, logo que anoitecesse o frio seria cortante e a catedral já estava cheia: não havia mais onde se abrigarem; as próprias escadas que conduziam ao campanário tinham todos os degraus ocupados, e a cada momento chegava mais gente aos portões, com filhos e objectos de uso caseiro às costas. Qualquer que fosse a sua religião, pensavam que estariam ali seguros. Enquanto observávamos este espectáculo, vimos abrir caminho um rapaz com uniforme vietnamês e armado de espingarda: foi detido por um padre, que lhe tirou a arma.
O padre a meu lado disse, à laia de explicação:
- Aqui somos neutros. Estamos em território de Deus.
Eu pensei: «Que estranha e miserável população que Deus tem no seu reino, assustada, regelada, faminta ('Não faço ideia de como vamos alimentar esta gente', dissera-me o padre); poder-se-ia supor que a um grande rei era possível realizar mais do que isto». Mas depois pensei: «Onde quer que se vá é sempre o mesmo - não são os governos mais poderosos que têm as populações mais felizes»".
O Americano Tranquilo, Graham Greene.
Não consigo deixar de comentar, de me intrometer, a felicidade faz-me divagar como conceito, como meta, como aquilo que em última instância não é nada mais que um mito tolhido por outros para seus próprios fins; mas estou a fugir à questão; a irrelevância do "«Onde quer que se vá é sempre o mesmo - não são os governos mais poderosos que têm as populações mais felizes»" situa-se não em qualquer pensamento longínquo, doutrinal, ou filosófico mas no mero ponto que ninguém é ou poderá ser feliz, poderá conseguir mais que o próximo, mas o pleno embate directamente no que nós somos, por mais poderoso e estagnado, ou mais pobre e mais conectado como aquilo que falta de talento insinuarei como mundo empírico, a verdade é que sempre teremos que acordar e enfrentar o que nos rodeia com a nossa capa de felicidade, o que irremediavelmente a levará a fragmentar-se.
ResponderEliminarPonto último, alongo-me quando não devo, quero eu dizer no fim da equação, governo e felicidade e suas relações não são mais que pura retórica falaciosa, fica muito bem em quadros estatísticos e conceitos financeiros, mas se não deturpamos o sentido inerente à verdadeira fragância a felicidade minha, tua, nossa, vossa pode existir por escassos segundos até que auto induzida ou não a redoma de ataraxia for violada por outros.
Peço desculpa pela intromissão e pelo divague.