domingo, 10 de setembro de 2017

eles comem tudo e não deixam nada



(The Patsy, 1964, Jerry Lewis)

Logo nas primeiras cenas de "THE PATSY”, o “ciclo biológico” processa-se abruptamente: da morte para a morte, sem passagens pelo meio, irónica transição num filme em que tanto se fala do “nascimento”, do “fazer nascer” uma estrela. A morte de um comediante famoso, momento com que o filme se inicia, propicia a reunião de emergência da sua equipa (produtor, argumentista, secretária), corja de interesseiros que, durante o seu sucesso em vida, foi sugando e aproveitando-se da sua fama e riqueza: a casa em Malibu, as viagens à Europa, a mansão em Palm Springs... O seu “plano de sobrevivência” é simples e não menos “vampiresco”: encontrar um zé-ninguém (“nobody” é o termo que usam) e fazer dele, custe o que custar, uma nova estrela, ou seja, um novo corpo de cujo sangue se possam alimentar daí em diante. Quando Jerry, moço de recados (bellboy, novamente; working class heroe, sempre) do hotel, entra em cena no seu estilo desajeitado e inconveniente, a corja imediatamente se apercebe de que está ali o alvo por que ansiavam, a sua nova mina de ouro (não por acaso, os fatos pretos, os tiques físicos e o fumo dos cigarros aproxima-os da figura de gangsters...).

 
Autênticos vampiros, dirigem-se, silenciosos e em passo de zombie, progressivamente até ao seu encontro, rodeando-o, intimidando-o, a sede de dinheiro já a fazer-lhes correr água na boca. E como a sede é tanta, apertam-no de tal forma que Jerry acaba por cair da varanda. A morte do famoso comediante que inicia o filme dá lugar, então - leva a -, à morte daquele que ainda não o chegou a ser e, com isso, ironicamente, à própria morte da "solução financeira" da grupeta. Claro que, no filme, Jerry não morre (aliás, a queda da varanda serve para fazer passar os créditos) e “volta à tona” porque aterra em cima de um trampolim – algo (o “trampolim”) que acabará por rimar com a última cena do filme, na qual Jerry, agora “encostado à parede” (ou à varanda) pela mulher por quem está apaixonado, finge novamente cair no abismo, para voltar, uns segundos depois, a entrar em cena: “It’s just a movie, see? I’m fine. The people in the theatre know I ain’t gonna die. Here, see, it’s a movie set…”.

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