segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

eternamente (2)

 
 
 
Em Fevereiro de 2013:
 
"A amizade como inquebrantável esperança, como última salvação para a vida - ao menos espiritual - de um homem. Prova de que as relações humanas podem surpreender quando menos esperança (justamente) nela depositamos, ou quando pensamos já tudo ter vivido e nada mais de iluminante esperar para as nossas vidas - no caso, a personagem interpretada por Bruno Ganz não espera mesmo nada, pois já sabe, desde o início do filme, que irá ser internado em breve, mu...ito provavelmente como destino final. No filme de Angelopoulos, essa vitalidade que a amizade sempre encerra resulta do encontro entre um velho e uma criança, cujos contornos (geracionais, nomeadamente) lhe imprimem uma certa dimensão transcendental, como de um milagre se tratasse: a dado passo, temos a sensação de que este velho e esta criança são o último velho e a última criança no mundo, derradeiros seres humanos caminhando de mão dada e amparando-se mutuamente. A metáfora não é disparatada, pois que nem um nem outro, ainda que por circunstâncias distintas, têm alguém. Ele, velho e solitário, preso à dor da perda da mulher e condoído pelo alheamento da filha, vive na sua melancolia solipsista; o miúdo, por sua vez, é um imigrante desterrado num país sobre o qual nada sabe senão a rejeição e a marginalidade. Deste circunstancialismo 'geográfico' associado à questão da imigração se podendo extrair, ainda, uma outra putativa amizade, a saber, a que une (pode unir) diferentes povos e culturas, o que tem ressonâncias acrescidas atendendo ao concreto contexto cultural em causa (a questão dos Balcãs, figurada pela criança albanesa, tema, de resto, por demais explorado no cinema de Angelopoulos)".
 
Escrevi isto quando me convidaram para pensar num filme que, de alguma forma, pudesse representar o significado e a riqueza de uma amizade. Não sendo o filme mais icónico de Bruno Ganz, A Eternidade e Um Dia é o primeiro que me vem à cabeça sempre que penso nele. Ganz está presente, como poucos (Tati, Mastroianni, poucos mais), no meu universo cinéfilo mais pessoal, afectivo, e muito ligado ao meu próprio mergulho nos filmes. Ouvir a sua voz em off no último filme do von Trier foi das experiências mais reconfortantes que tive numa sala de cinema nos últimos meses.
 
“All passed by so quickly. This suspect pain... my stubbornness to want to learn,to want to know... then the darkness... the silence around me... the silence. All made me believe that before the end of winter with the ethereal silhouettes of the boats and their sudden breakthroughs in the sky, with the lovers along the promenade in the declining sun, and the hypocritical promise of the spring, all made me believe that before the end of winter... …My only regret, Anna... but is it only one?... is not to have finished anything. I left it all as a draft, shattered words here and there”.

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