quarta-feira, 17 de junho de 2015

Walsh #30 Na morada dos cosmos/Gravity (Sopa de Planos)



Sopa de planos metafísica, desta feita, no À pala de Walsh (clicar).

"Pensar (n)o cosmos é pensar (n)o homem – essa a razão por que, ao contrário de tantos outros planos contemplativos do cosmos “puro e duro”, escolhemos um que ilustra essa relação, essa dependência inextricável. Não há cosmos sem o homem; não há homem sem o cosmos. Literalmente: o cosmos, a ideia de cosmos é, ela mesmo, uma construção intelectual, logo, humana. Se essa relação de dependência é tão evidente ou “rasteira”, ela não deixa, no entanto, de convocar as mais transcendentes e inquietantes questões. Aliás, ela levanta mesmo “a” questão das questões, a da existência e do seu sentido: quem somos? Porque estamos aqui? Quem ou oquê nos pôs aqui? Para onde vamos (não só, ou não tanto, no “depois da morte”, mas, sobretudo, enquanto grupo, enquanto humanidade, em marcha em direcção a alguma coisa)? Tudo perguntas de um tal teor que só possui equivalente plástico na vastidão, escuridão do cosmos, onde uma cientista se confronta com questões ironicamente nada existenciais, muito terrenas: a perda de uma filha e o urgente conserto da nave em que se encontra (com vista privilegiada para a Terra), sob pena de se desintegrar no espaço. Se, como referimos, é de dependência a relação entre homem e cosmos, entre particular e universal, terreno e transcendente, logo se infere como essa é uma relação, digamos, de amor-ódio: o cosmos é grande, infinito, e o desconhecimento que dele temos assusta aterradoramente o homem (inclusive sendo fonte das mais conspirativas teorias!) ao mesmo tempo que o desafia à descoberta e à superação (?) da sua condição. O medo, a sensação de esmagamento perante algo ou alguém que é maior que nós são esses pés sem piso firme onde pousar, esses braços pedindo ajuda, o esgar desesperado que se advinha dentro do capacete. Tudo no mais absoluto e belo silêncio, mestria de Cuarón, que o preserva no filme. Mais ou menos à deriva, o homem está só e só continuará no cosmos".

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