(The Shop Around The Corner, 1940, E. Lubitsch)
"Vou já dar a volta à conversa humanista (mesmo com H grande) a que The Shop Around The Corner se tem prestado, para lhes perguntar se conhecem mais algum filme que acabe com uma mulher a pedir a um homem que lhe mostre as pernas. E, depois, o homem a mostrá-las mesmo a ela e a nós, com a câmara colocada cá em baixo, para não perdermos pitada desse arregaçar de calças. Em aplauso à grandeza (ou à beleza) da visão, um beijo em close-up e a fusão com a palavra fim. Se conhecem, digam-me já porque eu nunca vi. (…) Nestas coisas do desejo - e Lubitsch o sabe melhor do que ninguém - há que dar tempo ao tempo. E esse tempo dilata-se tanto quanto o jogo do gato e rato dos dois, espectadores e sabedores, como eles. Nunca pensávamos era só ter direito a ver umas pernas de homem.
(…)
Pode-se ter visto muito. Mas certamente nunca se viu uma tal consanguinidade entre os melhores e os piores sentimentos, entre a verdade e a simulação. Se já por isso sabíamos que Lubitsch era um fingidor, nunca o vimos fingir tão sinceramente. E por isso também chega a fingir que é dor a dor que deveras sente. The Shop Around The Corner inventaria o poema de Pessoa se ele não tivesse sido já inventado. Mas é diferente em palavras ou em imagens. Porque estas fingem ainda mais e doem ainda mais".
J. Bénard da Costa
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