Da minha janela vejo o Bósforo todos os dias: divisões e correntes, agitações e marés. Tal como no homem, tal como no mundo.
sexta-feira, 7 de outubro de 2011
espelho meu, espelho meu,
Será que sou o único que acha tremendamente exagerado este culto em volta da partida do Steve Jobs? (Eu posso explicar porquê, se for mesmo o único...)
depois da quantidade de histórias (por vezes de veracidade duvidosa) que se contavam a respeito do homem e do seu carácter ruim. não fiquei propriamente triste por ele ter partido. quanto ao culto, se calhar está directamente relacionado com essas histórias: a polémica alimenta o ícone. embora a mim sempre me passou ao lado.
Não te dês ao trabalho de explicar, não és mesmo o único. Também não compreendo... Para mim não foi mais do que um tipo que incentivou o consumo e o culto de uma marca de objectos tecnológicos estupidamente caros. Não era músico, não escreveu obras de destaque, não batalhou pela causa Palestiniana, não fez uma descoberta importante para a medicina... nada.
Joana A., muito resumidamente, é exactamente isso o que eu penso (excepção à causa palestiniana, cuja complexidade inviabiliza, a meu ver, opiniões de sentido único...).
Repensei a minha posição, Joana A. É que é preciso distinguir entre a ideia/conceito e a utilidade/aplicação que ele tem. Trocando por miúdos: a criação de um computador, a descoberta de que se pode armazenar num pequeno disco a nossa colecção inteira de música, etc. etc. é, enquanto ideia/conceito/invenção, importantíssimo. Do ponto de vista do Conhecimento (assim mesmo, com "C" em maiúscula), é um marco civilizacional.
Outra coisa, diferente, é o que se faz com essa ideia, que tipo de utilidade/aplicação ele vai ter na vida das pessoas. Creio que ninguém duvida que o facto de podermos ter, num só aparelho, um dispositivo de armazenagem da nossa música preferida, um operador telefónico e um motor de navegação na internet é fantástico, do ponto do vista do que representa para o homem, para a sua qualidade de vida, facilidade de movimento e comunicação - e isso não é tão meritório como um álbum histórico ou a descoberta da penicilina? Com as devidas distâncias, penso que estão num mesmo nível. Mas, e é aqui que bate o ponto, tudo isto (ideia) se esbate quando vemos a aplicação, na prática, das coisas; e aí, de facto, tens toda a razão. Estes sucessivos "gadjets", uns atrás dos outros, cada um com uma merdinha 0.00001% mais desenvolvida que o anterior, espetadas nos olhos dos indivíduos a partir de uma publicidade brutal, megalómana, cria neles uma vontade incontrolável de consumir, de comprar. Cria, no fundo, necessidades que, muitas vezes (não todas, claro), não existem. E isso é, de facto, perverso e algo que não podemos aceitar como "natural" ou "consequência dos tempos" (embora eu me sinta sempre um resistente alienígena nestas coisas). Os indivíduos consomem porque sim, porque lhe dizem para consumir, porque querem estar ao mesmo nível do colega de escritório que já tem um (que já... consumiu), porque se querem identificar com os jovens de sucesso que aparecem com os aparelhos nos anúncios, porque, enfim, há toda uma cultura de consumo que os impele a estarem "dentro" dela, porque quem está fora é como se não estivesse em lado nenhum. Como se não existisse. Hoje, o consumo é isso: faz-nos existir. É um catalisador para aqueles que se pretendem identificar com algo (supostamente para "ser diferente", que coisa irónica e pateta...). Consumo, logo penso. Vai-te embora, Descartes. Já escrevi demais, vou-me calar, senão depois a minha Mãe diz que sou um velho do Restelo (e no Restelo é só snobes e eu não curto essas merdas :)).
Bem, eu nunca coloquei em causa a importância da evolução tecnológica. Jamais o poderia fazer, seria insensato, infundado e injusto.
Aquilo que penso vai ao encontro do que escreveste na segunda parte do teu extenso comentário. O que me causa espécie é a manobra de marketing absurda que se encena em volta do tema. Hoje sai o Telefone X, para a semana o Telefone Y, que vem com mais uma pseudo-funcionalidade. Daqui a um mês sai o Telefone Z, que coloca no Telefone Y a etiqueta 'obsoleto' e no pensamtento do teu colega de trabalho a grande excitação: "Tenho mesmo que ter este". Não contentes, ainda dão à luz o Tablet A... E o ciclo repete-se.
É por esta manobra que o Steve Jobs vai ser recordado, mesmo que pouca gente seja capaz de perceber isso...
6 comentários:
depois da quantidade de histórias (por vezes de veracidade duvidosa) que se contavam a respeito do homem e do seu carácter ruim. não fiquei propriamente triste por ele ter partido. quanto ao culto, se calhar está directamente relacionado com essas histórias: a polémica alimenta o ícone. embora a mim sempre me passou ao lado.
Não te dês ao trabalho de explicar, não és mesmo o único. Também não compreendo... Para mim não foi mais do que um tipo que incentivou o consumo e o culto de uma marca de objectos tecnológicos estupidamente caros. Não era músico, não escreveu obras de destaque, não batalhou pela causa Palestiniana, não fez uma descoberta importante para a medicina... nada.
Joana A., muito resumidamente, é exactamente isso o que eu penso (excepção à causa palestiniana, cuja complexidade inviabiliza, a meu ver, opiniões de sentido único...).
Repensei a minha posição, Joana A. É que é preciso distinguir entre a ideia/conceito e a utilidade/aplicação que ele tem. Trocando por miúdos: a criação de um computador, a descoberta de que se pode armazenar num pequeno disco a nossa colecção inteira de música, etc. etc. é, enquanto ideia/conceito/invenção, importantíssimo. Do ponto de vista do Conhecimento (assim mesmo, com "C" em maiúscula), é um marco civilizacional.
Outra coisa, diferente, é o que se faz com essa ideia, que tipo de utilidade/aplicação ele vai ter na vida das pessoas. Creio que ninguém duvida que o facto de podermos ter, num só aparelho, um dispositivo de armazenagem da nossa música preferida, um operador telefónico e um motor de navegação na internet é fantástico, do ponto do vista do que representa para o homem, para a sua qualidade de vida, facilidade de movimento e comunicação - e isso não é tão meritório como um álbum histórico ou a descoberta da penicilina? Com as devidas distâncias, penso que estão num mesmo nível. Mas, e é aqui que bate o ponto, tudo isto (ideia) se esbate quando vemos a aplicação, na prática, das coisas; e aí, de facto, tens toda a razão. Estes sucessivos "gadjets", uns atrás dos outros, cada um com uma merdinha 0.00001% mais desenvolvida que o anterior, espetadas nos olhos dos indivíduos a partir de uma publicidade brutal, megalómana, cria neles uma vontade incontrolável de consumir, de comprar. Cria, no fundo, necessidades que, muitas vezes (não todas, claro), não existem. E isso é, de facto, perverso e algo que não podemos aceitar como "natural" ou "consequência dos tempos" (embora eu me sinta sempre um resistente alienígena nestas coisas). Os indivíduos consomem porque sim, porque lhe dizem para consumir, porque querem estar ao mesmo nível do colega de escritório que já tem um (que já... consumiu), porque se querem identificar com os jovens de sucesso que aparecem com os aparelhos nos anúncios, porque, enfim, há toda uma cultura de consumo que os impele a estarem "dentro" dela, porque quem está fora é como se não estivesse em lado nenhum. Como se não existisse. Hoje, o consumo é isso: faz-nos existir. É um catalisador para aqueles que se pretendem identificar com algo (supostamente para "ser diferente", que coisa irónica e pateta...). Consumo, logo penso. Vai-te embora, Descartes. Já escrevi demais, vou-me calar, senão depois a minha Mãe diz que sou um velho do Restelo (e no Restelo é só snobes e eu não curto essas merdas :)).
Ups! Consumo, logo existo. Vai-te embora mesmo, Descartes, que já ninguém te respeita.
Bem, eu nunca coloquei em causa a importância da evolução tecnológica. Jamais o poderia fazer, seria insensato, infundado e injusto.
Aquilo que penso vai ao encontro do que escreveste na segunda parte do teu extenso comentário. O que me causa espécie é a manobra de marketing absurda que se encena em volta do tema. Hoje sai o Telefone X, para a semana o Telefone Y, que vem com mais uma pseudo-funcionalidade. Daqui a um mês sai o Telefone Z, que coloca no Telefone Y a etiqueta 'obsoleto' e no pensamtento do teu colega de trabalho a grande excitação: "Tenho mesmo que ter este". Não contentes, ainda dão à luz o Tablet A... E o ciclo repete-se.
É por esta manobra que o Steve Jobs vai ser recordado, mesmo que pouca gente seja capaz de perceber isso...
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