Corri esse supremo risco que é o de escrever sobre os filmes do Tarkovsky e o resultado está aí, na minha nova crítica para o À pala de Walsh, desta feita em torno de "O Sacrifício" (1986), o último filme do grande realizador russo. Há muito tempo que queria escrever alguma coisa sobre os seus filmes e a verdade é que, pese embora o pouco tempo de que dispus para o efeito, me deu muito gozo poder dedicar-me a pensar sobre este filme e, inevitavelmente, a revisitar os anteriores. Pessoalmente, "O Sacrifício" estimula-me, especialmente, pelo convite que faz à reflexão sobre territórios que nem sempre tenho tido oportunidade de explorar em textos sobre cinema (e, talvez, de explorar no geral...): a espiritualidade, a transcendência, Deus.
O texto podem-no ler aqui (clicar); o filme poderão vê-lo amanhã, no Cineclube Ao Norte (Viana do Castelo), 21h45, pela módica quantia de zero euros.
Alexander deverá fazer amor com Maria (“Maria” – quem mais? –, qual medium divino), revelação que lhe é feita por Otto (um carteiro que traz notícias não é muito diferente, afinal, de um… “anjo mensageiro” gabrielesco) – embora – e não conseguimos ficar em paz com isto…. – do discurso de Otto não seja absolutamente linear se essa salvação se traduz no fim da guerra e na continuação da vida humana ou, simplesmente, no fim de tudo de uma vez só, para evitar mais sofrimentos. Encare-se ou não com razoabilidade a condição revelada por Otto a Alexander (a plausibilidade nunca foi, de resto, uma preocupação para a espiritualidade, antes sendo o implausível justamente condição e meio de legitimação da sua força e espectacularidade), o certo é que melhor ilustrativo do desligamento espiritual dos homens não podia existir do que a incredulidade com que Alexander acolhe a revelação de Otto – no fundo, e extremando o ponto de vista para nos fazermos entender: se, um dia, o mundo estivesse prestes a acabar e nos revelassem que aquele era o único modo de evitar o fim, cederíamos ou não na sua execução? Teríamos fé?
(Excerto)
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