Podia dizer várias coisas sobre o novo filme de Lars Von Trier, umas menos cinematográficas que outras. Por exemplo: que nunca vi uma mulher em depressão tão sexy como a Kirsten Dunst (sim, à frente mesmo da Monica Vitti e da Jeanne Moreau). Ou: que os jardins de Melancholia me lembraram, perversamente, os de Marienbad (em Resnais). Também: os cavalos, filmados à Tarkovsky (em Andrei Rublev), sinalizadores da interação homem-mãe natureza. E até: que, suspeito, não seria só Justine que já estaria ciente da inevitabilidade do fim do mundo, mas, também, a sua mãe (note-se como Justine é, no capítulo segundo do filme, uma mimetização da sua progenitora).
Mas o que mais me apraz escrever sobre o filme é mesmo no que toca à radical ironia que o perpassa: durante duas horas, são mais que muitos os planos em que as personagens olham persistentemente, com ar curioso e naif, para o céu. "Olhar para cima" é, como se sabe, um aforismo do quotidiano cujo sentido é o da necessidade de continuarmos em frente, ultrapassarmos os obstáculos, contornarmos as dificuldades da vida e a aparente invencibilidade da desgraça. No fundo, como se no céu, lá em cima, na morada de um Deus qualquer, se nos oferecesse a resposta, a saída para os nossos problemas terrenos. Pois bem: quando, no filme de Von Trier, os homens olham para cima, para o céu, nada mais vêem, afinal, que a sua morte, o fim da sua existência, enfim, o desaparecimento da humanidade. Mas, o que é pior, vêem-no sem o saberem, com olhos de encantamento, como se Melancholia se tratasse de um astro como outro qualquer e o devessem apreciar como sempre o fazem os homens desde que perceberam que não vivem sozinhos numa coisa a que chamaram de "espaço": com admiração, assomo, quase com vontade de lhe tocar para se assegurarem de que é... real. Tão real como o fim de tudo (e, como já alguém escreveu, é este um filme sobre o fim: não só do mundo, mas, outrossim, do amor, das convenções sociais, da família, etc.) É seco, é irónico, é cruel. Assim é Melancholia do primeiro ao último minuto.
Mas o que mais me apraz escrever sobre o filme é mesmo no que toca à radical ironia que o perpassa: durante duas horas, são mais que muitos os planos em que as personagens olham persistentemente, com ar curioso e naif, para o céu. "Olhar para cima" é, como se sabe, um aforismo do quotidiano cujo sentido é o da necessidade de continuarmos em frente, ultrapassarmos os obstáculos, contornarmos as dificuldades da vida e a aparente invencibilidade da desgraça. No fundo, como se no céu, lá em cima, na morada de um Deus qualquer, se nos oferecesse a resposta, a saída para os nossos problemas terrenos. Pois bem: quando, no filme de Von Trier, os homens olham para cima, para o céu, nada mais vêem, afinal, que a sua morte, o fim da sua existência, enfim, o desaparecimento da humanidade. Mas, o que é pior, vêem-no sem o saberem, com olhos de encantamento, como se Melancholia se tratasse de um astro como outro qualquer e o devessem apreciar como sempre o fazem os homens desde que perceberam que não vivem sozinhos numa coisa a que chamaram de "espaço": com admiração, assomo, quase com vontade de lhe tocar para se assegurarem de que é... real. Tão real como o fim de tudo (e, como já alguém escreveu, é este um filme sobre o fim: não só do mundo, mas, outrossim, do amor, das convenções sociais, da família, etc.) É seco, é irónico, é cruel. Assim é Melancholia do primeiro ao último minuto.
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