quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Pinochet

Lembro-me da primeira vez que vi a minha Mãe chorar - que soube que a minha Mãe também chorava. Era pequeno, mas não tanto assim, pois já me sentava à frente no carro. Era de manhã, a minha Mãe levava-me ao colégio e estava um bonito dia de sol.  Passávamos o Campo Alegre. A rádio, a Antena 2 (lembro-me porque, no caminho para a escola, era habitual a minha Mãe pôr-me a ouvir uma senhora que contava pequenos contos a essa hora), noticiava, não consigo recordar-me com exactidão, que centenas de famílias chilenas tinham finalmente visto confirmados, passados anos e anos, os nomes dos mortos seus parentes dados como desaparecidos durante o regime de Pinochet. Foi uma grande surpresa para mim e, a princípio, pensei que um "cisco" acometia, como era habitual, os olhos da minha Mãe. Em silêncio e numa fracção de segundos, sem que saiba ainda hoje explicar muito bem, percebi imediatamente que não, que era outra coisa. A minha Mãe assoou-se discretamente, baixou o volume da rádio e explicou-me isto que acabei de escrever. 

2 comentários:

Cristina disse...

O eco de nós mesmos no mundo sempre me interrogou. Talvez por fragilidade ou insegurança.
Hoje o mesmo "cisco" me acometeu, ainda que a emoção que o desata seja outra.

DoxDoxDox disse...
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