a primeira coisa que imediatamente quis fazer no dia seguinte foi surfar. sábado e acordo às horas a que só tenho por hábito acordar durante a semana. nem de propósito, mar fraco – se não quero arrefecer, nado. para a frente, para trás, esquerda e direita. nadar. na noite anterior, minutos antes, minutos mesmo, de me questionarem sobre se eu já sabia das “novas” (quanta perversidade nisto), tinha acabado de enviar uma mensagem a perguntar: “gostas de mac?”. ia acrescentar o parêntesis “mcdonald’s, de mac miller já sei que sim”, mas acabei por não o fazer. terão sido as batatas fritas menos saborosas que alguma vez provei na vida. e assim permaneci, sentado, sem saber o que fazer com um bilhete para o spike lee nas mãos dali a dez minutos. sentado novamente, então, agora na sala. mas, antes disso, voltar atrás, o transido casaco que ficou esquecido na cadeira. já o primeiro plano no ecrã: um mar de mortos. estes já não nadam, dois dedos que levo à frente dos olhos como o de niro na sala de cinema no taxi driver. vou pensando em como tinha escrito que, no "SWIMMING," a água se volvia em metáfora infinita, que tinha dado o exemplo do videoclip da “Stay”, embora ela já estivesse também presente, muito sintomaticamente, nos da “My Favourite Part” (ele começa quase submergido e termina à superfície) e da “Come Back To Earth” (o bonequito, explorador naval de olhos luminosos, que não pára de descer e descer e descer no fundo de um mar de ruínas…). mas não mais agora: o “memento mori” que se via no videoclip da “Self Care” cumpriu-se. finitude. já não há cá marés altas ou marés baixas, afogamentos, vir à tona e o diabo a quatro. só o diabo, o fundo do mar.
lutei até à última para que o título do artigo fosse: “Aprende a nadar, companheiro”. ossos do ofício: perdi. ficou: “Aprender a nadar com um falso disco de Verão”. não me interessava tanto a canção do sérgio godinho; o que eu queria, na minha ingenuidade, era dirigir-me a ele, Mac, interpelá-lo, uma palmada nas costas, dar-lhe a mão, contar-lhe que também eu ando para aqui a nadar, que somos muitos os que faltaram às aulas de natação (ninguém nasce ensinado, ou não?). isso, essa interpelação, até podia, de facto, ter acontecido, mas não fui diligente o suficiente; o editor, que me diz também estar apaixonado pelo disco, afirma que, tivesse eu feito a entrevista, e faríamos capa com o disco. e eu, palerma, que entrevistei já tanta boa gente a quem não tenho nenhum interesse particular em dar uma palmada nas costas, nem me lembrei dessa possibilidade. pois que peço para adiarmos o artigo, uma semana, vou conseguir entrevistá-lo – mas já não, timings, agora inês é morta. e morta ficou também a possibilidade de eu testemunhar a doçura, a graça, a simplicidade que todos lhe apontam na hora em que, depois de nos ter dado essa maravilhosa canção chamada “Come back to earth”, ele se decide a voltar lá para cima. “I just wanna go on tour. I wish it started tomorrow”, escreveu ele na sexta-feira; e foi mesmo, mas nem esperou por amanhã. contento-me, então, em citar a entrevista que deu à rolling stone – “Mac Miller Wants You to Know He's OK” é o título (e, enfim, ele parecia mesmo OK). que andamos todos para aqui a nadar, que a natação é, como se costuma dizer, o “mais completo dos desportos” foi o que eu repeti, umas semanas depois, ao meu irmão, antes e depois do pequeno-almoço, dos vómitos, das flocas, do caderno de versos alternativos, do manual de sonetos. disse-lho antes e depois de nadarmos naquelas águas onde eu já não entrava desde 2010, antes e depois de aninharmos com a nadadora-salvadora e ela nos chamar de cachorritos. antes e depois do susto que apanhámos quando a corrente o queria levar não sei para onde e o foram lá buscar. ouvimos o disco, o meu irmão e eu, separados por muitos quilómetros, ou não tanto assim, pois que, neste agosto, também eu viajo com o imperador adriano pela terra onde primeiro se divinizou o amor, a beleza, a mulher. afrodite. “The Divine Feminine”. ou “The Divine Femine”, como invariável e erradamente escrevi ao longo de todo o artigo (foi, provavelmente, da excitação). a partilharmos um quarto como há muitos, muitos anos não o fazíamos, o disco tocará umas quantas vezes ao fim do dia, enquanto nos revezamos nos banhos. mas não assim tantas, como não assim tantas foram as palavras que trocámos sobre ele.
Mac Miller não era, de todo, um músico com uma obra fabulosa: dos muitos álbuns e mixtapes que editou, a esmagadora maioria considero-a francamente mediana e mesmo desinteressante. nos últimos dois anos, porém, deixou dois formidáveis discos (“The Divine Feminine” e “SWIMMING”), os seus dois últimos, obras-primas da música popular americana do século XXI – num rico espectro que abrange o hip-hop, a pop, o funk, a soul, o R&B – que, pelo fundo mapeamento emocional que as insuflava, começavam a fazer de Miller referência para uma geração, como Dylan, Cohen, Bowie, Cobain ou Cave foram e são para outras. curiosamente, uma geração – a minha – que, no início da sua carreira, pouco ou nada lhe ligara (foi o meu caso, também), por nele ver apenas um rapper adolescente histriónico (e que mal há nisso? nenhum, evidentemente, mas, já se sabe, a idade, mesmo involuntariamente, embrutece-nos) como há por aí às dúzias. encontrei-me com o Mac, por isso, já tarde, mas, com toda a certeza, no melhor momento da sua música; isso não impede, porém, que me comova enquanto vou lendo os testemunhos de um sem-fim de miúdos que dizem ter crescido desde os 12, 13 anos com os seus discos (os tais que eu considero desinteressantes) e que nele vêem quase um colega do liceu desde o tempo em que ele, cachopo, se abanava castiçamente naquele footage caseiro do videoclip da “Best Day Ever”. esse mesmo adolescente que dirá alguns (poucos) anos depois: "Overdosing is just not cool. There's no legendary romance. You don't go down in history because you overdose. You just die". you just die. que citará whitney – a houston, quem mais – em “Hurt Feelings”. a sua música estava cheia de vida e de morte, e ele, enfim, parece que quis advinhar a segunda: “Swear the height be too tall so like September I fall”. dois discos que deixam no ouvinte uma alegre e desmedida vontade em lhe ouvir o próximo, testemunhar os caminhos que tomará o seu som (algo que me acontece com muito poucos músicos), tomar o pulso às curvas do seu estado de espírito, avaliar a força das braçadas. mas que também denotam o quanto de prometedor havia ainda para trilhar, como é o caso das actuações ao vivo, nas quais, mal-grado a excelência do naipe de instrumentistas de que se rodeou (sendo, ele próprio, um multi-dotado: guitarra, baterias, teclas, maquinaria digital) e com quem iria entrar em tour, a sua voz – tão magnificamente explorada em “SWIMMING”, como nunca até então havíamos testemunhado – podia ainda ser trabalhada (nos últimos vídeos de concertos que correm na internet, noto-o sempre bastante nervoso, e, no sábado, li alguém, talvez o Thundercat, a confirmar isso mesmo).
lancei-me a “SWIMMING” tremelicante, quase com o cínico medo de ver as minhas expectativas defraudadas depois do “The Divine Feminine”. o disco sai quando estou para fora, de férias, mas corro para a minha casa temporária para o ter no ipod, o qual, a partir desse momento, outra coisa não tocará nas longas e curtas viagens de carro, nocturnas e diurnas, com o sal na pele ou os medronhos no sangue. já percebi, afinal, a razão para a entrevista que nunca aconteceu: estava a meio de férias, não havia tempo, logística, meios. timings, novamente. escrevo então, em forma de elogio, que “SWIMMING” não é o típico disco de “superação”, com isso pretendendo fazer notar a maturidade do discurso (“uma reflexão descomprometida com metas” foi o que saiu…). olha, a maturidade para as malvas, antes tivesse sido a superação. mas também escrevi que era um disco perfeito. e é, embora eu nunca tenha querido que o fosse pelos mesmos motivos que yourcenar o insinuou nas memórias do tal imperador, mas que ele, o Mac, teimosamente o confirmou na sexta-feira passada – “Foi então que uma melancolia momentânea me apertou o coração: pensei que as palavras acabamento, perfeição, contêm em si a palavra fim: talvez eu tivesse somente oferecido mais uma presa ao tempo devorador”. quando tento descrever o último minuto do disco, o último de “So It Goes”, digo que fecho os olhos para aquele maravilhoso final de sintetizadores oníricos a ecoarem no êxtase total. omito, no entanto, o que, na altura, também me passou pela cabeça: que era um final muito… final, tom angelical de despedida; omito porque não o quis puxar para baixo (ainda a interpelação…), a tal palmada nas costas, vamos lá ser optimistas com isto, pronto. outra forma de omissão foi a que ele nos deixou na “2009” (“It ain't 2009 no more / Yeah, I know what's behind that door”): para o quê (o céu? o mar?) ou para quem dá a porta a que ele se refere, perguntava eu no texto tomando de referência a janelinha (escotilha?) da capa do disco. continuo sem saber. como acontece com tanta gente, para escrever sobre qualquer coisa (elogiosamente ou não, é irrelevante), ela tem de, por alguma forma, me espicaçar, provocar (isso, interpelar, como eu gostava de ter feito com ele); nessas viagens de carro, estes termos tornam-se, porém, ridículas minudências, pois que de um sobressalto permanente se tratou. escreverei poemas sobre o disco ouvido nessas viagens que guardo para mim, inclusivamente um verso nestes brutos termos: e eu furioso teclando notas e mais notas, inclusivamente a de que meus senhores diz-vos o crítico este é um disco para escutardes em estradas alentejanas pela noite fora mas já sabendo que, na hora da verdade, os meus olhos verão descontexto e ingenuidade nesse trecho
e viram, pois claro.
a minha listinha do para fazer tem escrito a tinta azul comprar discos mac miller desde o dia três de agosto; tem, também, uma chaveta com vectores: o The Divine Feminine e o SWIMMING para mim, e outro SWIMMING para o tiago, que tanto me aturou a ouvi-lo (não há mais música nesse ipod, noras?). nesse mesmo dia em que vou ver o spike lee, passo, umas horas antes, pela lavandaria perto de casa. quando me chego ao balcão e o rosto esbaforido da empregada, que vejo apenas de costas à medida que me aproximo, se vira completamente para mim, imediatamente pressinto que a conheço bem – quero dizer, evidentemente que não a conheço, mas rapidamente nos conheceríamos e entrosaríamos se trocássemos dois dedos de conversa, é a ideia com que fico (rara, mas muito raramente, me engano). e se são precisos dedos, então eu tiro as mãos dos bolsos ainda antes de dizer ao que venho: como estamos? bem, mal? assim assim? é, assim assim, estamos assim assim, o vapor fumegante que lhe realça o brilho das verrugas suadas. pois, é aquele fado, não é?, atiro, longe ainda de saber que, nesse mesmo dia, provarei das batatas fritas menos saborosas da minha vida. qual fado, senhor, é música de baile, carago, é preciso é abanar o esqueleto. isso: baile, abanar, continuar. SWIMMING.
lutei até à última para que o título do artigo fosse: “Aprende a nadar, companheiro”. ossos do ofício: perdi. ficou: “Aprender a nadar com um falso disco de Verão”. não me interessava tanto a canção do sérgio godinho; o que eu queria, na minha ingenuidade, era dirigir-me a ele, Mac, interpelá-lo, uma palmada nas costas, dar-lhe a mão, contar-lhe que também eu ando para aqui a nadar, que somos muitos os que faltaram às aulas de natação (ninguém nasce ensinado, ou não?). isso, essa interpelação, até podia, de facto, ter acontecido, mas não fui diligente o suficiente; o editor, que me diz também estar apaixonado pelo disco, afirma que, tivesse eu feito a entrevista, e faríamos capa com o disco. e eu, palerma, que entrevistei já tanta boa gente a quem não tenho nenhum interesse particular em dar uma palmada nas costas, nem me lembrei dessa possibilidade. pois que peço para adiarmos o artigo, uma semana, vou conseguir entrevistá-lo – mas já não, timings, agora inês é morta. e morta ficou também a possibilidade de eu testemunhar a doçura, a graça, a simplicidade que todos lhe apontam na hora em que, depois de nos ter dado essa maravilhosa canção chamada “Come back to earth”, ele se decide a voltar lá para cima. “I just wanna go on tour. I wish it started tomorrow”, escreveu ele na sexta-feira; e foi mesmo, mas nem esperou por amanhã. contento-me, então, em citar a entrevista que deu à rolling stone – “Mac Miller Wants You to Know He's OK” é o título (e, enfim, ele parecia mesmo OK). que andamos todos para aqui a nadar, que a natação é, como se costuma dizer, o “mais completo dos desportos” foi o que eu repeti, umas semanas depois, ao meu irmão, antes e depois do pequeno-almoço, dos vómitos, das flocas, do caderno de versos alternativos, do manual de sonetos. disse-lho antes e depois de nadarmos naquelas águas onde eu já não entrava desde 2010, antes e depois de aninharmos com a nadadora-salvadora e ela nos chamar de cachorritos. antes e depois do susto que apanhámos quando a corrente o queria levar não sei para onde e o foram lá buscar. ouvimos o disco, o meu irmão e eu, separados por muitos quilómetros, ou não tanto assim, pois que, neste agosto, também eu viajo com o imperador adriano pela terra onde primeiro se divinizou o amor, a beleza, a mulher. afrodite. “The Divine Feminine”. ou “The Divine Femine”, como invariável e erradamente escrevi ao longo de todo o artigo (foi, provavelmente, da excitação). a partilharmos um quarto como há muitos, muitos anos não o fazíamos, o disco tocará umas quantas vezes ao fim do dia, enquanto nos revezamos nos banhos. mas não assim tantas, como não assim tantas foram as palavras que trocámos sobre ele.
Mac Miller não era, de todo, um músico com uma obra fabulosa: dos muitos álbuns e mixtapes que editou, a esmagadora maioria considero-a francamente mediana e mesmo desinteressante. nos últimos dois anos, porém, deixou dois formidáveis discos (“The Divine Feminine” e “SWIMMING”), os seus dois últimos, obras-primas da música popular americana do século XXI – num rico espectro que abrange o hip-hop, a pop, o funk, a soul, o R&B – que, pelo fundo mapeamento emocional que as insuflava, começavam a fazer de Miller referência para uma geração, como Dylan, Cohen, Bowie, Cobain ou Cave foram e são para outras. curiosamente, uma geração – a minha – que, no início da sua carreira, pouco ou nada lhe ligara (foi o meu caso, também), por nele ver apenas um rapper adolescente histriónico (e que mal há nisso? nenhum, evidentemente, mas, já se sabe, a idade, mesmo involuntariamente, embrutece-nos) como há por aí às dúzias. encontrei-me com o Mac, por isso, já tarde, mas, com toda a certeza, no melhor momento da sua música; isso não impede, porém, que me comova enquanto vou lendo os testemunhos de um sem-fim de miúdos que dizem ter crescido desde os 12, 13 anos com os seus discos (os tais que eu considero desinteressantes) e que nele vêem quase um colega do liceu desde o tempo em que ele, cachopo, se abanava castiçamente naquele footage caseiro do videoclip da “Best Day Ever”. esse mesmo adolescente que dirá alguns (poucos) anos depois: "Overdosing is just not cool. There's no legendary romance. You don't go down in history because you overdose. You just die". you just die. que citará whitney – a houston, quem mais – em “Hurt Feelings”. a sua música estava cheia de vida e de morte, e ele, enfim, parece que quis advinhar a segunda: “Swear the height be too tall so like September I fall”. dois discos que deixam no ouvinte uma alegre e desmedida vontade em lhe ouvir o próximo, testemunhar os caminhos que tomará o seu som (algo que me acontece com muito poucos músicos), tomar o pulso às curvas do seu estado de espírito, avaliar a força das braçadas. mas que também denotam o quanto de prometedor havia ainda para trilhar, como é o caso das actuações ao vivo, nas quais, mal-grado a excelência do naipe de instrumentistas de que se rodeou (sendo, ele próprio, um multi-dotado: guitarra, baterias, teclas, maquinaria digital) e com quem iria entrar em tour, a sua voz – tão magnificamente explorada em “SWIMMING”, como nunca até então havíamos testemunhado – podia ainda ser trabalhada (nos últimos vídeos de concertos que correm na internet, noto-o sempre bastante nervoso, e, no sábado, li alguém, talvez o Thundercat, a confirmar isso mesmo).
lancei-me a “SWIMMING” tremelicante, quase com o cínico medo de ver as minhas expectativas defraudadas depois do “The Divine Feminine”. o disco sai quando estou para fora, de férias, mas corro para a minha casa temporária para o ter no ipod, o qual, a partir desse momento, outra coisa não tocará nas longas e curtas viagens de carro, nocturnas e diurnas, com o sal na pele ou os medronhos no sangue. já percebi, afinal, a razão para a entrevista que nunca aconteceu: estava a meio de férias, não havia tempo, logística, meios. timings, novamente. escrevo então, em forma de elogio, que “SWIMMING” não é o típico disco de “superação”, com isso pretendendo fazer notar a maturidade do discurso (“uma reflexão descomprometida com metas” foi o que saiu…). olha, a maturidade para as malvas, antes tivesse sido a superação. mas também escrevi que era um disco perfeito. e é, embora eu nunca tenha querido que o fosse pelos mesmos motivos que yourcenar o insinuou nas memórias do tal imperador, mas que ele, o Mac, teimosamente o confirmou na sexta-feira passada – “Foi então que uma melancolia momentânea me apertou o coração: pensei que as palavras acabamento, perfeição, contêm em si a palavra fim: talvez eu tivesse somente oferecido mais uma presa ao tempo devorador”. quando tento descrever o último minuto do disco, o último de “So It Goes”, digo que fecho os olhos para aquele maravilhoso final de sintetizadores oníricos a ecoarem no êxtase total. omito, no entanto, o que, na altura, também me passou pela cabeça: que era um final muito… final, tom angelical de despedida; omito porque não o quis puxar para baixo (ainda a interpelação…), a tal palmada nas costas, vamos lá ser optimistas com isto, pronto. outra forma de omissão foi a que ele nos deixou na “2009” (“It ain't 2009 no more / Yeah, I know what's behind that door”): para o quê (o céu? o mar?) ou para quem dá a porta a que ele se refere, perguntava eu no texto tomando de referência a janelinha (escotilha?) da capa do disco. continuo sem saber. como acontece com tanta gente, para escrever sobre qualquer coisa (elogiosamente ou não, é irrelevante), ela tem de, por alguma forma, me espicaçar, provocar (isso, interpelar, como eu gostava de ter feito com ele); nessas viagens de carro, estes termos tornam-se, porém, ridículas minudências, pois que de um sobressalto permanente se tratou. escreverei poemas sobre o disco ouvido nessas viagens que guardo para mim, inclusivamente um verso nestes brutos termos: e eu furioso teclando notas e mais notas, inclusivamente a de que meus senhores diz-vos o crítico este é um disco para escutardes em estradas alentejanas pela noite fora mas já sabendo que, na hora da verdade, os meus olhos verão descontexto e ingenuidade nesse trecho
e viram, pois claro.
a minha listinha do para fazer tem escrito a tinta azul comprar discos mac miller desde o dia três de agosto; tem, também, uma chaveta com vectores: o The Divine Feminine e o SWIMMING para mim, e outro SWIMMING para o tiago, que tanto me aturou a ouvi-lo (não há mais música nesse ipod, noras?). nesse mesmo dia em que vou ver o spike lee, passo, umas horas antes, pela lavandaria perto de casa. quando me chego ao balcão e o rosto esbaforido da empregada, que vejo apenas de costas à medida que me aproximo, se vira completamente para mim, imediatamente pressinto que a conheço bem – quero dizer, evidentemente que não a conheço, mas rapidamente nos conheceríamos e entrosaríamos se trocássemos dois dedos de conversa, é a ideia com que fico (rara, mas muito raramente, me engano). e se são precisos dedos, então eu tiro as mãos dos bolsos ainda antes de dizer ao que venho: como estamos? bem, mal? assim assim? é, assim assim, estamos assim assim, o vapor fumegante que lhe realça o brilho das verrugas suadas. pois, é aquele fado, não é?, atiro, longe ainda de saber que, nesse mesmo dia, provarei das batatas fritas menos saborosas da minha vida. qual fado, senhor, é música de baile, carago, é preciso é abanar o esqueleto. isso: baile, abanar, continuar. SWIMMING.
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