segunda-feira, 23 de junho de 2008

materialismo

Ludwig Feuerbach, em "A Essência do Cristianismo" (1841), deu a explicação e o golpe fatal. Ressuscitando um tema bastante trabalhado, Fuerbach defendia que a razão pela qual os seres humanos se parecem com Deus não é por Deus nos ter criado à sua imagem mas por nós o termos criado à nossa. Embora este argumento fosse conhecido dos gregos antigos, Montesquieu, filósofo do Iluminismo francês e teórico do Direito, desenvolveu-o com graça nas suas satíricas "Cartas Persas" (1721), que são uma descrição fantasiosa de conversas entre viajantes persas e os seus anfitriões franceses. Num passo memorável, um francês conta a história de uma viagem através de África em que ficou chocado por ver que a arte e a escultura africanas representavam Deus como sendo uma mulher, gorda e - valham-nos os céus - preta. (...) O seu amigo faz notar: "diz-se, e bem, que se os triângulos tivessem um Deus, este teria três lados". Esta é, no essencial, a posição de Feuerbach.
Na perspectiva de Feuerbach, nós, seres humanos, pegámos nas capacidades que pertencem aos seres humanos, elevámo-las em pensamento a um nível infinito e depois inventámos um ser exterior a nós que encarna todas estas perfeições. Este Deus, então, é omnisciente, omnipotente e inteiramente bom (diversamente dos seres humanos, que sabem um bocadinho, são um bocadinho poderosos e um bocadinho bons). Mas curvamo-nos perante este produto da nossa imaginação em vez de reconhecermos as nossas qualidades pelo que são e tentarmos gozá-las em nosso proveito. Isto, na perspectiva de Feuerbach, ao desviar a nossa atenção e capacidades criativas, impede-nos de viver uma vida verdadeiramente humana e de criar uma sociedade verdadeiramente humana. Assim, segundo Feuerbach, que vai mais longe do que os pensadores anteriores, devíamos abandonar a religião e substituí-la por um humanismo radical: um entendimento, gozo e celebração das nossas capacidades verdadeiramente humanas, que nos permitirão criar pela primeira vez uma genuína comunidade na terra.


in Porquê ler Marx hoje?, Jonathan Wolff

3 comentários:

D. disse...

e se deus é apenas um humano com marionetes na mão, ao mesmo tempo que muitos outros humanos pelo mundo fora brincam com as suas próprias marionetes, faz todo o sentido a história. faz sentido o ser humano estabelecer sempre as suas marionetes quando chega a um novo local, "chegou a vontade de deus", pensam. e a partir daí resolvem tornar aquele mundo novo na sua própria imagem...

Manuel Marques Pinto de Rezende disse...

mais uma vez, o comentário da Daniela passa ao lado do texto como se ela não o tivesse lido.

então, podemos dizer que Deus é um dado semi-adquirido, independentemente de haver religião ou não?
os pressupostos que eu tiro do texto, é que a ideia de religião confraterniza com a de Deus, mas não é a única possível...
se o Humanismo "Radical" pretende à idealização de um homem mais bom, mais conhecedor, mais forte e poderoso, então continua a admitir a existência de Deus, sem usar os métodos ditos repressivos da religião? mas não será já um pressuposto o facto de a religião basear a sua doutrina na formação de um homem à imagem desse mesmo Deus, que
é feito à imagem de um Homem Ideal? e então, se o Deus é o Homem Ideal, não é legítima então a religião?

D. disse...

desculpa manel por nem toda a gente conseguir atingir as tuas interpretações. as únicas verdadeiras e dogmas supremos. lol