sexta-feira, 27 de julho de 2018

com excepção dos do ecrã, sempre tive medo dos mortos. corpos ao comprido que miro só de longe. mas talvez por ver os netos, tão miúdos ainda, a olharem o avô como eu olho os do ecrã, os joelhos dos pequenos tocando serenamente a madeira do novo berço, ganhei uma força redobrada para fazer o que, vejo agora, já quis fazer antes, talvez mais com o meu tio eurico do que com o meu avô. no derradeiro momento, aproximo-me e coloco a minha mão sobre as dele, só sinto a pele, sei que um rosário as cobre mas não o sinto. a inês dirá que, curiosamente, estão frias como sempre estiveram, embora nisso nada haja de curioso. o neto mais pequeno é muito dado, abraça-se a mim com os seus bracitos quentes e morenos, jogamos uma coisa qualquer no telemóvel até que, sem eu reparar, o ambiente que, com o passar das horas, já se havia descomprimido volve-se solene novamente, silêncio. e, então, cantamos

os lírios lírios são

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