segunda-feira, 8 de outubro de 2018

tudo a que tens direito
não é

é... educaste-as tantos
anos para isto
fecharem-te
a boca (já não bastava
teres mau ouvido) abrindo
as suas goelas muito sérias:
Mãezinha, a gorda
não!
mas tu insistes
fazes justíssima birra, a gorda
sim
gordíssima gostosíssima
a melhor parte da carne
de que a tua semana é feita

o teu homem (em quem vejo
beijo o senhor ferreira, ou o contrário já não sei
deus o tenha) quer ver o jogo, chegar a casa
ainda o sol não adormeceu
mas antes disso há o sofá torrado
de nascença e pelo sol dos anos
dispensas que eu te tire os
sapatinhos
nunca foram de cinderela só
lavoura, mãos grossas
gastas grosseiras

aninhas como o rapazito
que num dia quente ficou à tua
guarda enquanto os pais foram
a Marrocos fumar
desertos de tardias tolices
não sabendo que quando voltarem
o rapazito olhá-los-á com estranheza
apontando para o portão as calças sujas
com a areia das galinhas

quem são

enquanto me baixo
e te olho penso eternamente
crescer
é um lugar estranho (tantas vezes o escrevi
adulterando de emprestado o título
de um filme de que nem gosto especialmente)
a partida e a chegada deste caminho
portas que sucessivamente
inevitavelmente
se vão invertendo
velhos novos novos
velhos quem
cuida de quem
quando passamos a ser nós a fazer-lhes as batatas fritas
infindáveis festinhas na barriga
quando
em que momento
local, dia, hora
exactamente?

cubro-te com a mantinha que não
é azul nem improvisadamente
estrategicamente foi
dividida em duas
porque o lucas hoje nem veio, ficou a
crescer (precisamente)

beijo-te muito sem saber
piscar os olhos como fazias
antes de teres os joelhos
ancas
empedernidos
apalpo-te os veios carnudos do
rosto mas

nada dizes, os olhos
acordados não
abres.
que pensarás agora que
finges dormir como o rapazito
embaraçado
escondendo segredos
(este segredo foi a tua filha quem mo disse)

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