domingo, 28 de abril de 2013

contact sport



"Love is a contact sport", álbum Whitney (1987). Whitney Houston.


Whitney parece-me um álbum definidor, a par de outros, dos anos 80 e de um tempo em que a pop tinha um refinamento que, julgo eu, perdeu entretanto (é ouvir aquele baixo, logo no início, a destilar o funk jamesbrowniano), e que lhe advinha do facto de estar paredes-meias com a melhor música negra e respectivos intérpretes (por isso é que Houston tem um dueto com um monstro como Teddy Pendergrass no álbum imediatamente anterior, Whitney Houston, 1985).

quarta-feira, 24 de abril de 2013

da liquidez


Naissance des Pieuvres (2007), Céline Sciamma.


Como a modernidade líquida de Z. Bauman, a adolescência é também, enquanto processo de crescimento, um período líquido: período de incertezas, dúvidas, medos, anseios, inquietudes (e, em nova analogia com Bauman, podemos também dizer que, na vida, anteriormente à adolescência, conhecemos um período sólido, assente na infância e nos seus padrões de estabilidade). Incertezas, desde logo, acerca da orientação sexual de cada um (é a leitura mais imediatista do filme); mas incertezas, também, sobre aquilo que constitui, mais latamente, a substância das nossas vidas, e que, concretamente na adolescência, está em permanente convulsão: o bem e o mal, o amor e a amizade, a infância e o "ser adulto", a inclusão na maioria ou a procura de formas de ser e de estar alternativas com que genuinamente nos identificamos. 

É de tudo isto que Naissance des Pieuvres trata, com uma subtileza, uma graça, uma serenidade, admiráveis. Fá-lo não só do ponto de vista narrativo e estético, mas, ainda, de um ponto vista que é, essencialmente, plástico (e simbólico): não é por acaso que é na piscina, espaço de água imensa, que grande parte do filme se passa. A água vai, precisamente, de encontro à ideia de liquidez, do tal período líquido; água que, durante quase todo o tempo, cobre o corpo (e o corpo é outro dos grandes temas deste filme) das personagens - por vezes sugerindo até, nas cenas fora da piscina, a ideia de transpiração, como se elas estivessem em transe, o que, no caso de Marie, não anda muito longe da verdade (cena da maçã) -, como que acentuando a sua intrínseca liquidez. Assim se obtendo uma correspondência perfeita entre a liquidez (interior) das personagens e a liquidez (exterior) do cenário.

Temos, portanto, um elemento plástico e cénico (água) como equivalente psicológico do estado interior das personagens - o que, ao contrário do que poderia sugerir à primeira vista, é diferente daquilo que Antonioni faz nos seus filmes, pois que, aí, o espaço é instrumento determinante do estado psicológico das personagens, queremos dizer, é o espaço que determina o seu ennui. Diferentemente, no filme de Céline Sciamma, a água não tem esse efeito impositivo, já que lhe pré-existe um dado, a saber, a adolescência enquanto período crítico de questionamento e auto-descoberta. Nenhum (o elemento plástico água e a condição psicológica das personagens) determina o outro; convivem, equivalem-se, respiram lado a lado. São os corpos de Marie e Anne boiando sobre a piscina, as suas costas fundidas na superfície da água como duas inseparáveis faces da mesma moeda, daquilo a que chamamos de crescer.
Apetece, por isso, inverter uma expressão que hoje está tão na moda ("x não é uma questão líquida") e dizer: crescer é uma questão... líquida. Se é.

sexta-feira, 19 de abril de 2013

por antecipação

As pessoas costumam dizer que o que de pior existe em vivermos as coisas por antecipação é sofrer por antecipação. Errado: o fúnebre e aterrador está na absoluta incapacidade de sermos supreendidos (ou de nos deixarmos ser supreendidos). Pela vida, pelos imponderáveis, pelo todo poderoso acaso. 

terça-feira, 16 de abril de 2013

naissance des pieuvres



Estarei, amanhã, numa mesa de debate da Faculdade de Psicologia da UP a comentar o filme Naissance des pieuvres (2007), de Céline Sciamma. Sintam-se convidados.


"Synchronized-swimming is an integral part of the film, and acts as an important symbol. Tell us about that… 

Synchronized swimming is the only sport that is just for girls, and it says a lot about what is expected from girls in society. You have to be smiling and posing, and pretending you're not working hard at it. It's the only sport in the world that I can think of where you have to pretend you're not doing a sport. With the matching bright, painted on faces and caps, the girls are uniform and unidentifiable from one another. All the hard work goes on under the water, unseen to spectators, where they kick and balance and fight and tread water. Above the water all you see is perfect, in-sync feminine poses with a smile. It's like girls going to battle. The whole concept of it really fascinates me".

sexta-feira, 12 de abril de 2013

justeza


Ferrugem e Osso (2012), Jacques Audiard.

Houve um crítico do Expresso (creio que o Francisco Ferreira) que utilizou a palavra justeza para descrever o modo como o Audiard filmou esta cena. É isso. Bom fim-de-semana.

terça-feira, 9 de abril de 2013

ter dúvidas

Podemos perguntar-nos se esse tão nobre vício crítico - com raízes nos iluministas (ou até, mais remotamente, no famoso aforismo socrático) e plena consagração na pós-modernidade - de tudo questionar, de "pôr em causa", não conduz, frequentemente, em última análise, a um relativismo - do qual o "cultural" é o que mais carreira tem feito no meio académico - cujo produto acabado é o impasse absoluto e, pior, totalitário. Porque é disso que se trata, já que a tirania do "ter dúvidas", na medida em que faz da reflexão um novelo interminável e foge - de modo consciente e intelectualmente cobarde, muitas das vezes - às soluções reclamadas pelos homens, se pode revelar tão ou mais asfixiante que a daqueles que, por ortodoxia, estupidez ou preguiça, nunca perderam tempo a destapar as sombras do pensamento, bolsando sentenças irrevogáveis sobre os mais variados assuntos. Ali, a ausência de respostas fundada numa reflexão, numa dialéctica, que, saudável num primeiro momento, redunda, a final, num grau zero do pensamento-em-acção; aqui, a existência de uma (só) resposta pronta decorrentede uma irremediável carência (a do pensamento crítico).
É, de resto, da tão moderna apologia do "ter dúvidas" que resulta outra das modas epidérmicas da nossa contemporaneidade: a de que "mudar de ideias" permanentemente, sem um suporte intelectual fundamentado que acompanhe esse processo, é, só por si, sinal de inteligência (ou, o que é pior, de "modernidade" - seja lá o que isso for...), atirando o pensamento consistente e solidificado (que é diferente de ortodoxo) para a vala da vulgaridade ou mesmo da mediocridade. E já nem falamos na legimitidade - intelectual, a única que, para aqui, releva - que todo o pensamento ortodoxo continua, em todo o caso, a possuir, por mais que dele possamos (veementemente) discordar.

quinta-feira, 4 de abril de 2013

We knew the only way to make it work was work together



"The Book of Soul", álbum Control System (2012). Ab-Soul.


Já não se fazem coisas destas (porque já ninguém o sabe fazer? porque o amor já não é o que era? porque é de mau gosto?...): do Ab-Soul para a Alori Joh. Rest in peace.

"We knew the only way to make it work was work together
Seven whole years, seven whole years


It was supposed to end with our grandkids

Luckily for me I'm used to being cut short
But I'm such a nice guy, why Lord?
Why Lori?
Why'd you have to take her from me?
Guess you needed your angel face for all of heaven to see
Your picture still on my mirror and it's so scary
I swear I still ain't looked at your obituary
So now I'm so doped up I think I'm flying
I hope the spliff will never finish
I guess the Mayans wasn't lying
2012 my world ended
You used to say that I could see the future
You was wrong, cause you was in it
And I was just with you the day before
You said you loved me, I said I loved you more
(...)
I never lied: I love you in a place where there's no space and time"

segunda-feira, 1 de abril de 2013

kissin' pink



"Kissin' Pink", mixtape Live. Love. A$AP (2011). A$AP Rocky.