Na televisão, numa reportagem por algumas escolas, uma miúda (16, 17 anos, talvez), com ar duro mas esperto, diz, num misto de militantismo e espontaneidade: “o amor não é tudo na vida”. Ouvimos isto e pensamos: aqui está uma miúda madura. Porquê? Provavelmente, pelo facto de, há mais ou menos algum tempo atrás, determinada(s) experiência(s) nos ter(em) levado a acreditar, hoje, nessa ideia, assim como por temos esse ensinamento bem vivo no presente, i.e., no exacto momento em que a frase daquela miúda nos entra pelos ouvidos com uma instantaneidade de verdade esmagadora. Acontece que isso não quer necessariamente dizer que aquela miúda é madura ou que aquela frase é reveladora de maturidade. Nem que a frase continue a fazer sentido para nós daqui a cinco anos. E se, passado esse tempo, já não fizer sentido, em que tosco lugar fica a maturidade? Deixou a frase de revelar maturidade? Nós deixamos de ser maduros por já não nos revermos nela (contrariando a escala "cronológica" do amadurecimento)? A miúda deixou de ser madura?
A ideia de maturidade, ou daquilo que é sinal de maturidade, é das coisas mais débeis com que vivemos (com excepção no que toca ao vinho e às obrigações jurídicas), e o mais surpreendente é que, não obstante, é das ideias feitas mais consolidadas no senso comum e que, por isso, mais intensamente circulam no discurso sobre a nossa existência, sobre assuntos morais, até na política. Ela tem latente um processo de cristalização da experiência, de consagração de "dados adquiridos"; tem latente uma de certo modo ingénua (o perfeito oposto de... maturidade) percepção de uma meta alcançada, algo que, aparentemente, não sofre mais variações e que, na sua constância (ou pela sua constância), fixa um parâmetro de comportamento e de aferição dos restantes à sua luz. Todavia, se, daqui a uns anos, já não nos identificarmos com aquela frase - porque, por uma razão ou por outra, as circunstâncias da vida nos fazem crer, num dado momento, que, de facto, o amor é tudo na vida -, a ideia de maturidade esvazia-se tão rápida e embaraçosamente como um balão mal atado por uma criança.
Não sei que conclusão tirar disto; talvez a mais imediata seja a de lamentar a maturidade da miúda que (já) não acredita que o amor é (ou pode ser - ups, um pingo de maturidade misturado com "sensatez" a intrometer-se) tudo na vida. O que, por sua vez, me atribui a minha própria quota de maturidade, pois claro. Será que a nossa maturidade nos pode levar a dizer que uma miúda que, com esta idade, pronuncia uma frase deste teor é... imatura (mas porquê, porque é próprio das pessoas imaturas serem precocemente maduras?)?