sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Walsh #17 - O fumo diz, o fumo cala/O Deserto Vermelho (Sopa de Planos)



Decorreram ontem as primeiras Conversas À Pala no Porto, no Teatro do Campo Alegre. Foi um momento de debate e convívio em torno do cinema de Satyajit Ray e das linhas de força, cinematográficas e não só, que ele convoca: a Índia, o exotismo, o "realismo" (e o neorealismo italiano, por inerência), o melodrama, a "universalidade" e a "particularidade", etc..

Muito em breve, o video da Conversa estará disponível on-line. Até lá, aproveito para dar conta da última Sopa de Planos, na qual participei com um apontamento sobre O Deserto Vermelho, do Mestre Antonioni. Fumem tudo aqui (clicar).


Il deserto rosso  (O Deserto Vermelho, 1964) é um filme, em si mesmo, a transbordar de fumo de uma ponta à outra (e, quando não é fumo, é… nevoeiro), um pensativo cigarro de Antonioni sobre a vida moderna mas, também, sobre o próprio cinema (sobretudo a partir da cor enquanto recurso fílmico). Curiosamente, um filme fumarento em que, ao contrário de tantos outros de Antonioni, o fumo provém não tanto dos cigarros como dessas fábricas que, parafraseando Antonioni, também podem ser belas. O fumo do progresso, com certeza, mas também o fumo etéreo que dissolve/no qual se dissolve Monica Vitti, que a aliena da realidade – não por acaso a ouvimos a dizer, não sem o seu quê de mórbido, que “C’è qualcosa di terribile nella realtà, e io non so cosa sia” (tradução livre: “Há qualquer coisa de terrível na realidade, mas eu não sei o que é”). Naquele que foi o primeiro filme a cores (e se muitas delas foram pintadas artificialmente, quem pode dizer, com segurança, que o que vemos no ecrã não são já as cores induzidas pela distorção mental de Vitti?) do Mestre italiano, o fumo ora contrasta (como uma reminiscência do preto e branco) ora se harmoniza (como neste plano) com as cores e respectivas temperaturas da Ravenna industrial por que Vitti, como em todos os filmes da “Trilogia do Silêncio”, deambula insatisfeita, entediada, neurótica. Para um realizador que fez da relação entre a paisagem e a psicologia dos personagens uma das traves-mestras da sua arte, o fumo é o primeiríssimo indício do tal mundo novo (o do progresso, da indústria, da tecnologia), da tal nova natureza ou nova harmonia (como escreveu Manuel S. Fonseca n’As Folhas da Cinemateca Portuguesa) que Vitti (Antonioni?) encara, nisso vendo alguns uma mera necessidade de adaptação (caso do crítico que citámos), outros uma autêntica opressão visualmente representada através do “esmagamento” dos personagens pelos colossais edifícios e máquinas fabris, bandeiras, por sua vez, de todo um regime de produção metódico, frio e utilitarista. Troque-se “produção” por “existência” e eis aquilo para que Antonioni chama (somos tentados a escrever “chamou”…) a nossa atenção.


quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Ida, no Passos Manuel

A Milímetro exibe, hoje, Ida (2013, Pawel Pawlikowski), aquele que foi, para mim, um dos filmes do ano. Não percam. Às 22h, no Passos Manuel.

terça-feira, 28 de outubro de 2014

o chão está solto

"De que adianta
ter os pés na Terra
se a Terra os tem aqui no Universo?
(...)
o chão está solto, José
solto
e rodando firme aí no espaço".


com os pés na terra, Francisco Azevedo.

sábado, 25 de outubro de 2014

Conversas À Pala - próxima quinta-feira




Renova-se o convite: Satyajit Ray, comentado e efabulado pelos nossos convidados Daniel Ribas e Pedro Flores, na primeira Conversa À Pala no Porto. Já na próxima quinta-feira (30 Outubro), no Teatro Municipal do Campo Alegre, pelas 21h.

sexta-feira, 24 de outubro de 2014

vidas fodidas

Vestiam coletes com a sinalética do município enquanto arranjavam o jardim, mas algo me disse que as duas mulheres não estavam no seu habitat natural, talvez pela forma pouco profissional com que lidavam com o assunto, talvez pela cumplicidade que, ao longe, pelos gestos e esgares que trocavam, lhes advinhei. Cabelo loiro desgrenhado, quarentonas, gastas e  mal tratadas pela vida e por si próprias. Creio que seriam duas presidiárias, numa saída para "trabalho comunitário". Quando passei mais de perto por uma delas, debruçada num saco do lixo e com uma vassoura na mão, a mulher elevou-se e, quando se preparava para falar com a outra que tratava do jardim mais ao longe, acabou por desabafar, fanfarrona, com os dois: "Vida de jardineiro é fodida... Rai's parta a jardinagem". 

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Árvores, Pássaros e Almofadas




Com lançamento agendado para dia 22 de Novembro (Plano B, 22h), o aguardado álbum de Minus, Árvores, Pássaros e Almofadas, já tem o primeiro single a rodar, com produção a cargo de Virtus.

"Marionetas" diz bem do que vem aí. Enjoy.

sexta-feira, 17 de outubro de 2014

Heimat



Heimat - Crónica de Uma Nostalgia (2013), Edgar Reitz.

Sei, com a mesma certeza que tenho duas mãos e dois olhos, que Heimat nunca sairá de mim. Tal como este Antonioni ou aquele Bodganovich nunca saíram nem sairão. Diferentes na forma e na narrativa, têm em comum - em menor dose o de Antonioni, porventura - o facto de serem filmes "totais", no sentido em que abarcam a vida toda: as emoções todas, as questões todas (as existenciais e as mais corriqueiras), as fases biológicas todas (desde o primeiro dia em que nascemos ao dia que vamos a enterrar).

Crónica de uma nostalgia. Quão certeiro, trágico, maravilhoso é este título. Através dele, a câmara de Reitz é como se fosse o olhar de Deus: o que é nostálgico, aqui, é a própria "vida", o dia-a-dia dos homens, e é Deus que o narra, é Deus o cronista.

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

"Conversas À Pala" no Porto (2)




Agora com genérico, realizado e montado por Catarina David.

"Conversas À Pala" no Porto - Satyajit Ray, 30 de Outubro, Teatro Municipal do Campo Alegre


Cartaz: Sabrina D. Marques

Na sequência do que tinha prometido, divulgo agora a realização, no dia 30 de Outubro (quinta-feira), no Teatro Municipal do Campo Alegre, das Conversas À Pala, uma iniciativa do À Pala de Walsh com raízes em Lisboa (e na Cinemateca) e que agora passará a ter também um pólo no Porto, numa equipa composta pela Sabrina D. Marques, pelo João Araújo e por mim.

A primeira Conversa À Pala iniciar-se-á impreterivelmente às 21h e antecederá a exibição do primeiro filme do ciclo organizado pela Medeia Filmes dedicado ao realizador indiano Satyajit Ray. Oportunidade para falar do outro grande "Ray" (a par do Nicholas) do Cinema com Daniel Ribas (Investigador, Docente universitário e editor da Revista Drama) e Pedro Flores (Realizador, Argumentista e igualmente editor da Revista Drama).

Marquem já nas vossas agendas e... até breve!

sábado, 11 de outubro de 2014

la grande illusion



Os Maias (2014), João Botelho.

Palha, Paus e Pérolas



Enquanto salivamos - há tempo demais, tantos têm sido os adiamentos - pelo anunciado (já quase um mito, por esta altura) Trabalho & Conhaque - ou - A Vida Não Presta & Ninguém Merece a Tua Confiança (sucessor da obra-prima Eu Não das Palavas Troco a Ordem, 2007), Nerve teve a gentileza de nos brindar com uma compilação de sobras, i.e., faixas isoladas e colaborações que não entraram em nenhum dos seus trabalhos oficiais até ao momento. São 30 faixas de ouvir e chorar por mais que encontramos reunidas em Palha, Paus e Pérolas (2014) - e, se estamos a falar de Nerve, sabemos como este choro pode provir das mais diversas fontes: tristeza, alegria, humor, acidez, ironia, morbidez, perversidade, deboche, etc..

É tudo isto e bastante mais - há sempre uma surpresa, uma curiosidade, uma peculiaridade a mais que nos rouba um sorriso  - que podem encontrar nesta compilação (download gratuito aqui) de um dos mais talentosos e idiossincráticos rappers portugueses. "Boa noite, estúpidos!"

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Conferência "20 anos da entrada em vigor da CNUDM: Portugal e os recentes desenvolvimentos no Direito do Mar"

No âmbito do Ciclo de Conferências organizado pelo Instituto Jurídico da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, o Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental (CIIMAR), em colaboração com o primeiro, realiza, no próximo dia 29 de Outubro (quarta-feira), no Salão Nobre da Faculdade de Direito da Universidade do Porto (FDUP), uma Conferência sobre os recentes desenvolvimentos do Direito do Mar e a nova Lei de Bases do Ordenamento do Espaço Marítimo.

Programa e cartaz no sítio da FDUP.

sábado, 4 de outubro de 2014

crónica de uma nostalgia



Heimat - Crónica de Uma Nostalgia (2013), Edgar Reitz.